sexta-feira, 20 de maio de 2011

ENTENDENDO O PROBLEMA - PARASHÁ BECHUKOTAI 5771 (20 de maio de 2011)

Esta história real aconteceu há alguns anos. Chegou ao gerente da divisão de carros da Pontiac, da GM dos EUA, uma curiosa carta de reclamação de um cliente. E assim estava escrito: "Após várias tentativas sem sucesso, volto a mandar uma carta de reclamação para vocês, e não os culpo por não me responderem. Eu posso parecer louco, mas o fato é que nós temos uma tradição em nossa família, que é a de comer sorvete depois do jantar. Repetimos este hábito todas as noites, variando apenas o tipo do sorvete, e eu sou o encarregado de ir comprá-lo. Recentemente, comprei um novo Pontiac e, desde então, minhas idas à sorveteria se transformaram num problema. Sempre que eu compro sorvete de baunilha, quando volto da sorveteria para casa, o carro não funciona. Mas se eu compro qualquer outro tipo de sorvete, o carro funciona normalmente. Os senhores devem achar que eu estou realmente louco, mas não importa o quão tola possa parecer minha reclamação. O fato é que estou muito irritado com meu Pontiac, pois aparentemente ele tem alergia a sorvete de baunilha"
A carta gerou tantas piadas do pessoal da GM que o presidente da empresa acabou recebendo uma cópia da reclamação. Ele resolveu levar a sério a reclamação e mandou um dos engenheiros da GM conversar com o autor da carta. O engenheiro se espantou ao conhecer o dono do carro. Achou que encontraria algum tipo esquisito, mas o que viu foi um senhor bem-sucedido na vida e dono de vários carros. Para fazer um teste, foram juntos à sorveteria no Pontiac "alérgico". O engenheiro sugeriu comprar sabor baunilha. Para sua surpresa, no momento de voltar para casa, o carro realmente não funcionou. Quando o dono do carro trocou o sorvete por outro sabor, o carro funcionou normalmente.
O engenheiro voltou nos dias seguintes, na mesma hora e fez o mesmo trajeto. A única coisa que ele mudava era o sabor do sorvete. Com qualquer sabor o carro funcionava normalmente, mas misteriosamente, quando o sabor escolhido era baunilha, o carro não pegava na volta.
O problema acabou virando uma obsessão para o engenheiro, que passou a fazer experiências diárias, anotando todos os detalhes possíveis. Depois de duas semanas, chegou a uma grande descoberta, mas manteve o sigilo. Chamou o dono do carro e, juntos, foram mais uma vez comprar sorvete. O engenheiro pediu ao dono do carro que comprasse o sorvete de baunilha, mas, ao invés de pegar um pote fechado, orientou-o a pedir para que o vendedor enchesse um pote vazio com sorvete de baunilha. Assim foi feito e, para a alegria do dono do caso e alívio do engenheiro, desta vez o carro pegou. O carro não era alérgico a sorvete de baunilha.
O engenheiro explicou que havia descoberto uma pequena diferença entre o sorvete de baunilha e os outros sabores. Como o sorvete de baunilha era o mais vendido, ela já vinha pronto em uma embalagem fechada. Já os outros sabores tinham que ser retirados da lata e colocados em uma embalagem vazia. E qual era a diferença na prática? O homem levava alguns minutos a mais para comprar os outros sabores do que para comprar o sorvete de baunilha.
Mas o mistério ainda não estava resolvido. Por que aquela diferença de tempo causava o mau funcionamento do carro? Examinando o motor, o engenheiro fez uma nova descoberta: como o tempo de compra era mais reduzido no caso da baunilha em comparação ao tempo dos outros sabores, o motor não chegava a esfriar. Com isso, os vapores de combustível não se dissipavam, impedindo que a nova partida fosse instantânea. Isto explicava porque justamente com o sorvete de baunilha o carro não funcionava.
A partir deste episódio, a Pontiac mudou o sistema de alimentação de combustível e introduziu a alteração em todos os seus modelos"
Assim também acontece em nossas vidas. Às vezes temos certeza de que entendemos os motivos de algum problema ou dificuldade pela qual passamos, até que alguém de fora nos mostra que estávamos completamente enganados...
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Nesta semana lemos a Parashá Bechukotai, terminando o terceiro livro da Torá, Vayikrá. A Parashá começa com todas as Brachót (bênçãos) que recaem sobre o povo judeu quando andamos nos caminhos da Torá. Porém, depois disso o tom muda e a Parashá começa a descrever as terríveis calamidades que recaem sobre o povo judeu quando os caminhos da Torá são abandonados. Para nosso alívio a série de maldições e castigos listadas na Parashá terminam com um consolo: "E Eu lembrarei do Meu pacto com Yaacov, e também Meu pacto com Yitzchak, e também Meu pacto com Avraham Eu me lembrarei, e Eu me lembrarei da Terra" (Vayikrá 26:42). Da mesma forma que muitas das calamidades descritas na Parashá realmente aconteceram durante a história do povo judeu, justamente nas épocas em que o povo judeu mais se afastou do pacto com D'us em processos de assimilação, também podemos ter a certeza de que as palavras de consolo da Parashá se cumprirão no final dos tempos.
Mas deste consolo surge uma famosa pergunta: por que a ordem dos patriarcas está invertida? Explica Rashi, comentarista da Torá, que a ordem está de acordo com os méritos de cada um dos patriarcas, como se D'us estivesse dizendo "Se o mérito de Yaacov, o menor dos patriarcas, não for suficiente, então lembrarei do mérito de Yitzchak. Se também o mérito de Yitzchak não for suficiente, então lembrarei do mérito de Avraham, e será suficiente". Porém, esta explicação de Rashi tem um problema. Segundo nossos sábios, Yaacov foi o maior de todos os patriarcas. A prova disso é que tanto Avraham quanto Yitzchak tiveram filhos Tzadikim (Justos), mas também tiveram filhos Reshaim (malvados), Ishmael e Essav, que não tiveram o mérito de fazer parte do povo judeu. Já Yaacov teve 12 filhos completamente Tzadikim, que formaram as sagradas tribos de Israel. Então como pode ser que a ordem é de acordo com os méritos, do menor para o maior?
Muitas vezes é difícil entender por que D'us nos manda tantos testes e dificuldades na vida. Se pudéssemos escolher, certamente escolheríamos uma vida tranqüila, sem nenhum tipo de obstáculo ou desafio. Pedimos para D'us resolver nossos problemas e parece que os problemas apenas aumentam! A resposta deste questionamento está nas palavras do Pirkei Avót (Ética dos Patriarcas): "De acordo com a dificuldade, assim é a recompensa". Quanto maior é a dificuldade que a pessoa vence para atingir seus objetivos espirituais, maior é o mérito que ela alcança. É por isso que o Talmud nos ensina que "No lugar onde está um Baal Teshuvá (pessoa que se desviou, mas voltou aos caminhos corretos), um Tzadik Gamur (pessoa completamente justa) não pode alcançar". Uma pessoa que foi educada em uma casa onde não se cumpriam as leis da Torá e, apesar das dificuldades, se esforçou e conseguiu começar a cumprir as Mitzvót e a se afastar das transgressões, tem um mérito muito maior do que aquele que foi educado em uma casa religiosa e desde cedo foi educado para cumprir as Mitzvót da Torá.
Quando D'us nos manda dificuldades, não é por maldade. Ao contrário, são as dificuldades que nos dão mais méritos, que fazem nossas conquistas valerem mais. É por isso que os méritos de Avraham são maiores do que os outros patriarcas. Ele foi criado em uma casa onde todos faziam idolatria. Não apenas a sua casa, mas toda a sociedade onde ele vivia era idólatra, e Avraham teve que ir contra todos em sua crença de um único D'us. Ele teve que criar, a partir do nada, uma perspectiva e um modo de vida completamente diferentes. Avraham começou uma nova época na história e mudou o curso de toda a humanidade. Yitzchak teve menos dificuldades, pois nasceu em um mundo onde já existia esta nova perspectiva. Mas explica o Rav Matitiahu Salamon que a dificuldade de Yitzchak foi desenvolver a idéia de que um filho deve seguir fielmente as diretrizes estabelecidas por seu pai. Já Yaakov, ao contrário, não teve que começar uma nova religião nem precisou desenvolver o conceito de seguir os caminhos de seu pai. Ele enfrentou grandes desafios em sua vida, mas sua tarefa foi mais fácil do que seus antepassados. Assim, embora Yaakov tenha sido o maior dos patriarcas, seu mérito foi menor. Portanto, esta Parashá nos ensina a enxergar os problemas e as dificuldades com uma ótica completamente diferente.
Os méritos de Avraham são um grande incentivo para todos aqueles que, apesar de terem nascido em ambientes afastados da Torá, tiveram a coragem de mudar suas vidas. As dificuldades não são poucas, pois muitas vezes a família e os amigos não aceitam e não entendem. Mas herdamos de Avraham os méritos de ir contra a sociedade, de fazer o que é correto apesar das dificuldades. E de acordo com a nossa dificuldade será a nossa recompensa. Por isso, ao invés de reclamar, devemos agradecer a D'us por cada desafio, pois é a oportunidade de transformar uma pedra no caminho em um trampolim para que possamos chegar ainda mais alto.
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com/
Lv 26:3-27:34, Je 16:19-17:14, Mt.21:33-46

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