domingo, 19 de novembro de 2017

QUEM DÁ VIDA RECEBE VIDA - PARASHÁ TOLDOT 5778

O Sr. Meir, um viúvo bem idoso, vivia sozinho. Mesmo tendo trabalhado muito durante sua vida, agora ele já não tinha mais forças e o dinheiro estava no fim. Ele tinha três filhos, todos casados, mas que infelizmente estavam tão ocupados com suas famílias que quase não tinham tempo para visitá-lo. Sentia-se cada vez mais fraco e as visitas dos filhos eram cada vez mais raras. Ele se sentia um peso para os filhos, mas não podia mais ficar sozinho em casa.
 Preocupado com seu futuro, ele teve uma ideia. Chamou um amigo carpinteiro e pediu que lhe fizesse um baú, como os antigos baús de tesouro. Encheu o baú, trancou-o e deixou-o no fundo do armário da cozinha, junto com os pratos e talheres. Certo dia, quando seus filhos vieram jantar em sua casa, eles abriram o armário e descobriram o baú. Curiosos, eles perguntaram que havia dentro. O Sr. Meir, fingindo ter sido pego de surpresa, respondeu que não havia nada de especial, apenas algumas coisinhas que havia juntado durante a vida.
 Os filhos perceberam, ao ajudarem o pai a recolher a mesa, que o baú era pesado e que, ao ser movido, produzia um barulho como o de moedas. Os olhos deles brilharam, imaginando a fortuna que havia lá dentro. Mas ficaram preocupados, pois o pai já estava velhinho e alguém poderia roubar o baú. Decidiram que deveriam vigiar aquele baú dia e noite. Organizaram-se para que em cada semana um dos irmãos fosse morar com o pai. O Sr. Meir não cabia em si de contentamento.
 Algum tempo depois, o Sr. Meir adoeceu gravemente e faleceu. Os filhos organizaram um enterro digno, pois sabiam que uma fortuna os esperava, que certamente compensaria todo aquele gasto. Depois do enterro, os três irmãos procuram por toda a casa a chave do baú. Quando abriram, descobriram que o baú estava cheio... de cacos de vidro. O irmão mais novo ficou muito irritado, se sentiu enganado. Porém, o irmão mais velho, após refletir, disse:
 - Infelizmente fomos nós que causamos que o papai nos enganasse. Se ele não tivesse feito isso, não teríamos cuidado dele até o fim de sua vida. Estou envergonhado. Não o tratamos como ele merecia...

Um dos filhos esvaziou o baú, para ter certeza que não continha nenhum objeto de valor. Encontrou, no fundo, algo valioso. Era uma inscrição, na qual se lia: "Quinto mandamento: Honrará seu pai e sua mãe".
Nesta semana lemos a Parashá Toldot (literalmente "Gerações"), que descreve o nascimento dos irmãos gêmeos Yaacov e Essav. Enquanto Yaacov se tornou um grande Tzadik (justo) e dedicou sua vida ao estudo da Torá e aos bons atos, Essav se tornou um grande Rashá (malvado), dedicado à caça e aos maus atos, como assassinato e adultério. Como Essav era o filho primogênito, ele merecia receber de seu pai Ytzchak a Brachá (benção) de primogenitura. Yaacov acabou comprando de Essav a primogenitura por um mísero prato de lentilhas, porém não teve coragem de contar ao pai que Essav desprezava a espiritualidade a este ponto.
 Porém, se Essav era alguém tão ruim, que cometia transgressões tão graves, como seu pai não conhecia sua má índole? Essav conseguia enganar seu pai, em especial porque ele cumpria a Mitzvá de "Kibud Av Ve Em" (honrar os pais) de maneira exemplar. Um exemplo do nível de honra que Essav dava ao seu pai pode ser visto no momento em que Ytzchak quis dar ao seu filho Essav a Brachá de primogenitura. Rivka, esposa de Ytzchak, sugeriu ao seu filho Yaacov que entrasse no lugar de seu irmão para receber a Brachá. Yaacov ficou com medo de ser desmascarado, apesar de Ytzchak já estar cego. Rivka o tranquilizou e, para garantir que não haveria problemas, ela vestiu Yaacov com algumas roupas de Essav que ela tinha em casa. Que roupas eram aquelas? De acordo com Rashi (França, 1040 - 1105), era um jogo de roupas limpas que Essav deixava na casa de seus pais e as vestia toda vez que servia seu pai. Segundo outra opinião mencionada por Rashi, aquelas eram roupas reais que Essav havia roubado do rei Nimrod. Ele fazia questão de usar estas roupas reais todas as vezes que servia seu pai. Isto significa que a dedicação de Essav por seu pai era algo incrível, a ponto dele se trocar e vestir roupas limpas e honrosas todas as vezes que ia cumprir a Mitzvá de "Kibud Av Ve Em".
 Há um Midrash (parte da Torá Oral) que ressalta ainda mais a perfeição de Essav no cumprimento da Mitzvá de "Kibud Av Ve Em". Raban Shimon ben Gamliel declarou: "Toda minha vida eu servi meu pai, mas nunca atingi nem um por cento do nível de como Essav servia seu pai. Eu não prestava atenção à limpeza das roupas que eu estava vestindo (quando eu servia meu pai), somente quando eu saía em público eu prestava atenção às condições da roupa que eu vestia. Mas Essav, ao contrário, era rigoroso ao servir seu pai sempre com roupas limpas, mas não se importava de andar pelo mercado (em público) vestindo trapos". Isto significa que, mesmo nos esforçando muito, dificilmente chegaremos perto do nível de honra que Essav dedicava ao seu pai.
 Porém, há alguns detalhes da Parashá que aparentemente contradizem este conceito. A Torá nos revela que quando Yaacov tentou se passar por Essav para receber a Brachá no lugar dele, Ytzchak suspeitou que havia algo errado. De acordo com a Torá, o que traiu Yaacov foi sua voz, como está escrito: "Então Yaacov aproximou-se de Ytzchak, seu pai, e ele o apalpou e disse: "A voz é a voz de Yaacov, mas as mãos são as mãos de Essav" (Bereshit 27:22). Porém, de acordo com o Ramban zt"l (Nachmânides) (Espanha, 1194 - Israel, 1270), por Yaacov e Essav serem gêmeos, suas vozes eram idênticas. Então o que chamou a atenção de Ytzchak? Explica Rashi que enquanto Yaacov falava com seu pai de maneira respeitosa, pedindo a ele que por favor se sentasse para comer, Essav falava de forma impetuosa e sem educação. Mas como pode ser que Essav cumpria a Mitzvá de "Kibud Av Ve Em" de maneira tão completa e, ao mesmo tempo, falava com seu pai de maneira grosseira?
 Além disso, Essav se casou com mulheres indignas, o que causou muito desgosto aos seus pais. Nossos sábios ensinam que a fumaça produzida pelos serviços de idolatria feitos pelas esposas de Essav contribuíram para que Ytzchak perdesse precocemente a visão. Como Essav podia se comportar de maneira tão insensível em relação ao sentimento dos seus pais e, ao mesmo tempo, cumprir com perfeição a Mitzvá de "Kibud Av Ve Em"?
 Explica o Rav Yohanan Zweig que, de acordo com os sábios do Talmud (parte da Torá Oral), nossos pais devem ser honrados pelo simples fato de terem nos dado a existência, isto é, por terem nos trazido ao mundo. Este reconhecimento de que devemos nossa própria vida aos nossos pais pode causar dois tipos de sentimentos: uma sensação de endividamento ou um profundo sentimento de gratidão. Mas o que isto muda na prática?
 Normalmente não gostamos de nos sentir endividados, isto nos causa uma sensação negativa, da qual queremos nos libertar. Uma pessoa que tem uma dívida preferia nunca ter se endividado. A cada parcela paga da dívida, ela se sente um pouco mais livre. Quando a pessoa finalmente consegue quitar sua dívida, ela se sente completamente libertada. Portanto, tudo o que ela faz em relação ao pagamento da dívida causa a ela uma sensação agradável de libertação e isenção e, portanto, ela faz de tudo para terminar a dívida o mais rápido possível. Paralelamente, uma pessoa que serve seus pais apenas porque sente um tremendo senso de endividamento servirá seus pais apenas como uma maneira de "pagar" esta dívida, pois se sente incomodado.
 Por outro lado, uma pessoa que sente profunda gratidão pelos pais quer dedicar sua existência a eles. Uma forma de retribuir aos nossos pais por terem nos dado a nossa própria existência é dar a eles também existência. Isto ocorre quando nos minimizamos perante eles, reconhecendo a superioridade deles sobre nós, o que se expressa na prática quando escutamos o que eles têm a nos ensinar e andamos nos caminhos que eles nos indicam. Podemos dar vida aos nossos pais mostrando nossa devoção e anulação perante eles.
 É claramente mais fácil realizar um serviço com entusiasmo quando percebemos que estamos nos libertando através de nossas ações, e não que estamos nos limitando e nos reduzindo. É por isto que vemos um entusiasmo nos atos de "Kibud Av Ve Em" de Essav. Não porque havia uma motivação verdadeira de honrar os pais e engrandecê-los. Essav não se importava de verdade com seus pais, por isso fazia escolhas equivocadas que causavam tanto sofrimento a eles. Essav não se submetia à vontade de seu pai quando ela ia contra seu modo de vida. Essav se sentia endividado e, procurando por sua independência, servia seu pai como forma de pagamento. Ele sabia que quanto mais perfeito fosse seu serviço, menos dívida restaria para pagar. Ele se esforçava em um nível sobre-humano para servir seu pai, mas não se esforçava em aprender o que seu pai lhe ensinava. Ele trocava suas roupas externamente para servir seu pai, mas não se interessava em se anular perante ele e mudar por dentro.
 A forma ideal de honrarmos nossos pais é, por um lado, fazermos com o mesmo entusiasmo de Essav, buscando a perfeição em cada detalhe de como servimos eles, porém junto com a motivação correta, que é a vontade de nos comportarmos com submissão perante eles, dando assim uma maior existência aos nossos pais.
 Honrar os pais não é uma Mitzvá fácil de ser cumprida, mas é uma das poucas Mitzvót da Torá cuja recompensa está explícita: "Honre seu pai e sua mãe, para que se alonguem seus dias" (Shemot 20:12). O Talmud (Kidushin 39b) ensina que esta recompensa se refere à vida eterna no Mundo Vindouro. Por que esta é a recompensa adequada? Pois quando os honramos nossos pais da maneira correta, estamos dando a eles vida. D'us então nos recompensa "medida por medida", nos dando um nível de existência máxima, a vida eterna no Mundo Vindouro.
 Pelo fato de Essav, um Rashá, ter conseguido se destacar nesta importante Mitzvá, isto torna a nossa responsabilidade e o nosso desafio ainda maiores. Os pais cuidam dos filhos desde o nascimento e literalmente dão a vida por eles. Temos, portanto, a obrigação de devolver isto aos nossos pais. Da mesma maneira que um bebê é frágil e precisa de cuidados, o mesmo ocorre com um idoso, que se torna frágil e precisa de atenção, carinho e cuidados da família. Da mesma forma que recebemos vida dos nossos pais, que possamos dar a eles vida e, assim, receber de D'us a vida verdadeira, a vida eterna.

Shabat Shalom

R' Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com.br/
Gn. 25:19-28:9, Ml. 1:1-2:7

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

QUEM CONTROLA QUEM? - PARASHÁ CHAIE SARA 5778 (


"O Rav Shlomo Brevda zt"l (EUA, 1931 - 2013) certa vez encaminhou um jovem estudante de Torá dos Estados Unidos, com um enorme potencial, para uma Yeshivá muito forte em Israel, para que ele pudesse continuar seu caminho de crescimento espiritual. Porém, pouco tempo depois, o rapaz voltou desanimado, dizendo que não estava interessado em continuar estudando naquela Yeshivá. O Rav Brevda não entendeu a decisão do rapaz, pois a Yeshivá era muito conhecida por seu estudo de Torá em altíssimo nível. Ele então perguntou ao jovem o que havia de errado e o rapaz explicou:

- Rav, quando eu cheguei na Yeshivá, fiquei muito impressionado. Eu entrei no Beit Midrash e vi centenas de alunos completamente absortos em seus estudos, discutindo trechos da Guemará como se estivessem lutando por suas vidas. Foi algo que me deixou extremamente feliz e esperançoso de que aquele seria o lugar onde eu poderia crescer no meu estudo.

- Então o que aconteceu para você ter voltado tão desanimado? - perguntou o Rav Brevda.

- Da mesma maneira que eu me surpreendi quando eu entrei no Beit Midrash e vi os rapazes estudando, eu me surpreendi quando chegou a hora do almoço. Vi aqueles mesmos jovens que estudavam Torá com tanto vigor enchendo seus estômagos com o mesmo entusiasmo. Pareciam escravos de seus estômagos! Foi uma grande decepção. Não acho que é neste lugar que eu vou conseguir crescer espiritualmente".

Ensinam nossos sábios que uma pessoa não consegue viver ao mesmo tempo em dois mundos. Uma pessoa que se entrega aos seus desejos materiais certamente nunca atingirá seu verdadeiro potencial espiritual.
A Parashá desta semana, Chaie Sara (literalmente "A vida de Sara"), nos ensina que, mesmo depois de passar o teste de sacrificar seu próprio filho, as dificuldades na vida de Avraham ainda não haviam terminado. Quando ele voltou para casa, feliz por trazer de volta seu filho, ele encontrou Sara, sua esposa, morta. Começaram então longas negociações com o astuto Efron, um Chitita que habitava na Terra de Israel, para adquirir dele o local para o enterro de Sara. Após Efron inicialmente oferecer a terra gratuitamente para Avraham, no final ele acabou cobrando um valor abusivo de 400 moedas de prata.

Se prestarmos atenção nos versículos que descrevem a negociação de Avraham com Efron, perceberemos que sempre o nome Efron é escrito com a letra "vav" (עפרון), mas justamente no trecho que descreve que a transação foi finalmente realizada através da entrega do dinheiro (Bereshit 23:15), seu nome está escrito sem a letra "vav" (עפרן). Por que esta diferença, justamente neste versículo?

De acordo com Rashi (França, 1040 - 1105), a falta de uma letra no nome de Efron vem nos ensinar que ele falou muito mas não fez nem mesmo um pouco. Inicialmente ele disse a Avraham que estava disposto a dar gratuitamente a terra, mas no final acabou cobrando um preço injusto, se aproveitando do momento delicado pelo qual passava Avraham.

Já o Rav Yaakov ben Asher zt"l (
Alemanha1269 - Espanha, 1343), mais conhecido como Baal HaTurim, explica que a Guemátria (valor numérico) de "Efron" sem a letra "vav" é 400, valor que coincide com a quantidade de moedas de prata que ele recebeu na venda de sua terra. Isto significa que quando Efron recebeu esta quantia enorme de dinheiro, isto deu a ele uma nova sensação de valor. A partir daquele momento ele passou a se enxergar como alguém que "valia" 400 moedas de prata, pois Efron se auto definia através do seu status financeiro. Efron foi vítima de uma das maiores enganações do nosso "Yetser Hará" (má inclinação), que nos faz enfatizarmos o nosso status material, ao invés de enfatizarmos nosso nível espiritual. Esta má inclinação atinge o ser humano desde o erro de Adam Harishon, quando o ser humano passou a ter mais consciência do seu corpo do que de sua alma. Tendemos a nos identificar como sendo um corpo, não uma alma. Por exemplo, quando uma pessoa está doente, ela diz: "Não me sinto bem", enxergando o corpo como sua principal identidade. Uma declaração mais precisa seria "meu corpo não se sente bem", o que implicaria que temos a consciência de que nossa alma é nossa essência. Portanto, uma das partes principais em nosso Serviço Divino é desenvolver uma maior consciência da nossa alma e de suas necessidades.

Além disso, através da explicação do Baal HaTurim sobre a "Guemátria" do nome Efron, podemos ganhar um entendimento ainda mais profundo sobre o relacionamento entre o corpo e a alma. Quando Efron recebeu as 400 moedas de prata, certamente ele achou que sua importância no mundo havia aumentado, pois agora ele era um homem rico. Entretanto, a verdade é que ele perdeu uma letra no seu nome, e o nome de uma pessoa representa sua essência. Isto quer dizer que, enquanto Efron achava que havia aumentado seu valor, na realidade ocorreu justamente o contrário, seu valor verdadeiro como ser humano diminuiu. Além disso, a letra "vav" que ele perdeu em seu nome é a letra que representa a conexão. A letra "vav" significa "e", e é utilizada muitas vezes para conectar ideias e frases. O formato da letra "vav" também demonstra sua habilidade de conectar, pois se assemelha a um gancho, através do qual podemos conectar duas coisas. Quando Efron se aprofundou em seu materialismo, ele automaticamente diminuiu sua espiritualidade e perdeu seu "vav", isto é, seu elemento de conexão com D'us. Isto significa que, quando uma pessoa dá mais importância para o seu corpo e seus bens materiais, então automaticamente sua alma perde algo.

Ensina o Rav Yehonasan Gefen que esta relação inversa entre o corpo e a alma também pode ser percebida na Parashá da semana que vem, Toldot. Nossa matriarca Rivka engravidou e ficou confusa, pois seu bebê se mexia quando ela passava diante de um Beit Midrash, mas também se mexia quando ela passava diante de um centro de idolatrias. Ela então foi se aconselhar com um dos profetas da época, que revelou que havia dois bebês no seu ventre e que deles sairiam duas nações que viveriam em constante conflito. Além disso, o profeta acrescentou que quando uma nação subisse, a outra automaticamente cairia. A explicação mais simples desta profecia é que, durante a história, as nações de Yaacov (Israel) e de Essav (Edom) se contrabalanceariam, isto é, quando uma subisse, a outra cairia. Porém, alguns comentaristas explicam que esta profecia se refere a outro tipo de batalha. Yaacov representa nossa alma, enquanto Essav representa nosso corpo, e há uma luta constante entre estas duas forças. Quando a alma se eleva, as forças de desejo do corpo consequentemente se enfraquecem, e quando a alma enfraquece, as forças de desejo do corpo dominam.

Daqui aprendemos que é impossível a pessoa se dedicar, ao mesmo tempo, ao preenchimento das vontades de seu corpo e ao preenchimento da sua alma. Muitos pensam que não há nenhuma contradição, pois é possível viver uma vida de Torá e Mitzvót e, ao mesmo tempo, passar a vida correndo atrás da satisfação material. Entretanto, em última instância, esta pessoa é apenas escrava do seu corpo. Ela pode até permitir que seu corpo cumpra as Mitzvót, mas o fato dela não conseguir se desvencilhar dos desejos materiais em excesso, como a busca por prazeres gastronômicos e por dinheiro, é um sinal de que seu corpo está no controle, não sua alma.

De acordo com o Rav Brevda, é importante que exista a consciência desta luta entre o corpo e a alma. O corpo é muito poderoso e muitas vezes supera nossa busca por espiritualidade, mas enquanto temos a consciência de que existe uma batalha, podemos nos esforçar para fortalecer nossa alma. O problema começa quando não existe nem mesma a consciência da batalha, e isto pode ocorrer até mesmo entre as pessoas que cumprem Torá e Mitzvót. Por exemplo, muitas pessoas não sentem nenhum tipo de conflito quando comem um bolo de chocolate mesmo quando não estão com fome, simplesmente devoram o bolo sem nem mesmo pensar no porquê estão comendo. Isto é sinal de que a pessoa não percebeu que seu corpo está no controle, não sua alma.

O que devemos fazer para pelo menos "nos sentirmos" nesta batalha? David Hamelech nos ensinou que há duas maneiras de lutarmos contra o Yetser Hará: "Se afasta de mal e faça o bem" (Salmos 34:14). "Se afaste do mal" significa tirar um pouco da força do materialismo do nosso corpo. Mas como podemos fazer isso? O Rav Brevda sugere, por exemplo, que a pessoa se sirva com um prato generoso, mas nunca repita o prato, por mais gostosa que esteja a comida. Isto nos ajuda a controlar o impulso de querer pegar mais, o que já nos faz pelo menos sentir que estamos em guerra com as forças do nosso corpo. Além disso, temos que trabalhar o "Faça o bem", investindo no nosso crescimento espiritual, pois ao crescer espiritualmente, automaticamente estaremos enfraquecendo as forças de desejo do corpo e sua conexão com o materialismo.

O Rav Yehuda Loew zt"l (Polônia, 1525 - República Checa, 1609), mais conhecido como Maharal de Praga, ressalta que quando Rashi explica sobre a profecia dos gêmeos na barriga de Rivka, ele apenas menciona que quando Yaacov cai, Essav se levanta, mas não menciona o outro lado. Isto nos ensina que é Yaacov que está no controle de quem vai prevalecer. Essav só pode subir quando Yaacov cai, mas quando Yaacov tem sucesso em seu crescimento, então Essav fica sem opção. O mesmo se aplica em relação à batalha entre o corpo e a alma. É nossa escolha quem vai vencer. Se nos esforçamos para fortalecer nossas almas, então a força do materialismo do nosso corpo automaticamente se enfraquecerá. A batalha entre o corpo e a alma é longa e desafiadora, mas, se se ao menos iniciarmos a batalha, então o sucesso estará em nossas mãos.

Shabat Shalom

R' Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com.br/
Gn.23:1-25:18, 1Rs.1:1-31