sexta-feira, 29 de maio de 2015

O VALOR INFINITO DE CADA UM - PARASHÁ NASSÓ 5775

"O Rav Isser Zalman Meltzer z"l (Bielorússia, 1870 - Israel, 1953) estava em sua casa com alguns alunos quando um deles olhou pela janela e viu que um homem caminhava na direção da casa do Rav Isser Zalman. Parecia ser o Rav Yitzchak Zev Soloveitchik z"l (Bielorússia, 1886 - Israel, 1959), mais conhecido como Brisker Rav, um dos maiores sábios de Torá daquela geração, e isso causou um alvoroço entre os alunos. Quando o Rav Isser Zalman escutou que o Brisker Rav estava vindo visitá-lo, rapidamente vestiu suas roupas de Shabat em honra do estimado visitante e correu com seus alunos para recebê-lo.
 Porém, quando se aproximaram do homem, perceberam que na realidade não era o Brisker Rav, e sim um judeu comum muito parecido com ele. Então algo surpreendente aconteceu, pois o esperado seria que o Rav Isser Zalman virasse as costas e voltasse desapontado para casa, mas ele começou a tratar aquele homem simples com a mesma honra que teria tratado se realmente fosse o Brisker Rav. Convidou-o para entrar na sua casa, pediu que ele se sentasse na cabeceira da mesa e ofereceu a ele água e comida.
 O homem, surpreso com o tratamento de rei que estava recebendo, se sentiu incomodado pelo esforço que estava causando ao Rav e pediu para que ele parasse. O homem então explicou que havia vindo apenas para pedir ao Rav um documento, necessário para resolver certo assunto particular. O Rav alegremente escreveu e assinou o documento que o homem havia pedido e depois fez questão de acompanhá-lo até o portão de sua casa. Quando o Rav Isser Zalman voltou, encontrou seus alunos surpresos com sua conduta. Eles questionaram o porquê dele ter se esforçado tanto para honrar aquele homem, mesmo após ter percebido que era um judeu comum e não o Brisker Rav. O Rav Isser Zalman então explicou:
 - Na verdade, a Mitzvá de honrar as pessoas é tão grande que nós deveríamos honrar cada simples ser humano da mesma maneira que nós honramos os grandes sábios de Torá. Porém, por causa do nosso nível espiritual baixo, as Mitzvót não são tão importantes para nós, e por isso nós não tratamos cada pessoa com a honra que ela realmente merece. Mas neste caso eu tive o mérito da Providência Divina ter decretado que eu deveria me preparar equivocadamente para receber um grande sábio de Torá. No momento que entendi que era um engano, eu pensei: "Por que perder esta incrível Mitzvá somente pelo fato do visitante ser uma pessoa simples?". Foi por isso que eu me esforcei tanto para dar a este homem a mesma honra que eu teria dado ao Brisker Rav."
 Infelizmente não honramos as pessoas da maneira como deveríamos, pois não entendemos o incrível valor de cada ser humano. Se entendêssemos, correríamos para honrar todas as pessoas, até mesmo as mais simples. 
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Existe uma importante regra, transmitida pelos nossos sábios, de que a Torá é muito concisa. Nenhuma palavra, e nem mesmo uma única letra, está escrita desnecessariamente. Mas a Parashá desta semana, Nassó, termina de uma maneira que parece fugir desta regra. Quando o Mishkan (Templo Móvel) foi inaugurado, os Nessiim (príncipes) de cada tribo trouxeram doações particulares, um a cada dia, que incluíam utensílios de ouro e prata, animais para serem oferecidos como Korbanót (sacrifícios), incenso e farinha, em comemoração daquele momento tão importante para o povo judeu. É interessante perceber que, apesar de ser uma doação particular e não obrigatória, todos os Nessiim trouxeram exatamente as mesmas oferendas. E mais incrível ainda é o fato da Torá repetir, por doze vezes, com versículos idênticos, as oferendas de cada Nassi. Por que eles trouxeram exatamente a mesma oferenda? E por que repetir tantas vezes, se a Torá poderia ter escrito apenas a primeira oferenda e depois ter nos informado que as outras oferendas foram exatamente iguais?

Em relação a trazer exatamente a mesma oferenda, nossos sábios explicam que não foi nenhuma coincidência. Quando cada um dos Nessiim estava se preparando para trazer sua oferenda, eles pararam para refletir e entenderam que algo desastroso poderia acontecer. Como a natureza do ser humano é sempre querer se comparar com os outros, então havia o grande risco de cada Nassi querer oferecer mais do que o Nassi anterior, gerando inveja, competição e desunião. Portanto, em um ato de enorme grandeza espiritual, os Nessiim decidiram que todos doariam exatamente a mesma coisa. Este ato foi tão bem visto aos olhos de D'us que Ele fez questão de "gastar" muitos versículos da Torá para honrar cada um dos Nessiim pessoalmente.
Isto por si só já seria motivo para a Torá ter descrito as oferendas de cada um dos Nessiim de forma independente. Mas o Rav Simcha Zisesel Ziv Broida (Lituânia, 1824-1898), mais conhecido como Alter MiKelm, explica que há outro motivo, também igualmente importante. Uma pessoa que cumpre uma Mitzvá junto com um grupo poderia pensar que os méritos da Mitzvá recaem sobre o grupo, mas que não há nenhuma atenção especial de D'us para cada uma das pessoas deste grupo. Porém, isto não é verdade, pois D'us se alegra com cada Mitzvá que cada judeu faz. A capacidade de D'us de amar e cuidar de cada pessoa é infinita, e não é prejudicada pelo fato Dele amar um número tão grande de pessoas. Foi isso que D'us quis ressaltar ao repetir as oferendas de cada Nassi. Com a mesma intensidade que D'us estava contente com a oferenda do primeiro Nassi, Nachshon ben Aminadav, da tribo de Yehudá, assim também Ele se alegrou com as oferendas de cada um dos Nessiim.

Este conceito é um dos fundamentos da filosofia judaica, que muitas vezes se choca com outras filosofias. Por exemplo, os ateístas não acreditam que cada indivíduo tem um valor intrínseco. Cada ser humano é apenas mais um dentre bilhões de outros seres humanos, que vivem em um pequeno e insignificante planeta, dentro de um Sistema Solar minúsculo, localizado em uma das milhões de galáxias do universo. É por isso que tantas pessoas atualmente sentem uma enorme falta de valor próprio, pois realmente acham que são insignificantes e não tem nenhuma importância, como foi expressado na famosa letra de música que diz: "All in all you're just another brick in the wall" (Ao todo, você é apenas mais um tijolo no muro).

A visão da Torá é o oposto disso. Cada pessoa tem um valor infinito, pois foi criada à imagem e semelhança de D'us, e é amada por Ele de maneira especial e particular. E assim nossos sábios expressam esta ideia: "O ser humano é amado, pois foi criado à imagem [de D'us]" (Pirkei Avót 3:18). Pelo simples fato de cada ser humano ter uma alma, isto já faz com que ele seja amado por D'us. É interessante perceber também que, dentre todas as criaturas feitas por D'us, apenas o ser humano foi criado sozinho. Por que D'us criou um grande número de criaturas, enquanto Adam Harishon foi criado sozinho? A Mishná (Sanhedrin 4:5) responde que D'us estava nos ensinando que cada ser humano vale o mundo inteiro, e por isso todo aquele que salva uma única pessoa é considerado como se tivesse salvado o mundo inteiro.

Entendemos a importância e percebemos a ênfase que a Torá dá para o enorme valor de cada ser humano. Porém, quais são as aplicações práticas deste entendimento? Em primeiro lugar, isto nos ajuda a perceber nosso valor, não abrindo nenhum espaço para pensamentos negativos de que não valemos nada. A depressão já é chamada de "a doença do século", e atualmente atinge até mesmo jovens em idade escolar. Por que o mundo sofre tanto com a depressão? Pois as pessoas não entendem que elas têm um valor intrínseco infinito, e que este é o seu verdadeiro valor. A nossa sociedade rotula as pessoas de acordo com seu sucesso profissional ou seu sucesso financeiro, causando com que muitas pessoas, apesar de serem incríveis e especiais, se sintam inúteis.

Além disso, ao entender que D'us se importa com cada pequeno ato de cada pessoa no mundo, isso nos ajuda a desenvolver um senso de responsabilidade por cada ato que fazemos. O Rambam (Maimônides) (Espanha, 1135 - Egito, 1204) escreve que cada pessoa deve enxergar o mundo como se todos os atos da humanidade estivessem constantemente sobre uma balança, de um lado os bons atos e do outro lado os maus atos, e que esta balança está equilibrada. Portanto, a pessoa deve sentir a responsabilidade de que cada Mitzvá sua pode estar fazendo a balança pender para o lado positivo, enquanto cada transgressão sua pode causar o efeito contrário. Isto nos ajuda a internalizar o valor e a importância de cada pequeno ato que fazemos na vida.

Um último ponto é que, ao entendermos que nenhuma pessoa é insignificante aos olhos de D'us, temos que olhar os outros seres humanos desta maneira e tratar cada pessoa de acordo com seu imenso valor intrínseco. Vimos que a Torá "gastou" dezenas de versículos, repetindo exatamente as mesmas palavras, apenas para demonstrar o quanto D'us se importa com os atos de cada indivíduo. Por isso recai sobre nós a enorme obrigação de valorizarmos e respeitarmos cada ser humano, e nos importarmos com os atos de cada um, tanto se for alguém muito importante quanto se for apenas uma pessoa simples.

SHABAT SHALOM                                       
Rav Efraim Birbojm
Nm. 4:21-7::89, Jz. 13:2-25
 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

DIFICULDADES TRAZEM MÉRITOS - PARASHIÓT BEHAR E BECHUKOTAI 5775

"Certo dia Adriano estava observando um casulo de borboleta quando, naquele exato momento, uma pequena abertura apareceu. Ele resolveu se sentar e observar o que aconteceria. Ele viu que a borboleta se esforçava para fazer com que seu corpo passasse através daquele pequeno buraco aberto no casulo, mas em certo momento pareceu que ela havia parado de fazer qualquer progresso e não conseguia  mais sair. Adriano decidiu ajudar a borboleta: pegou  uma tesoura e cortou o restante do casulo.  A borboleta então saiu  facilmente, mas  seu corpo estava pequeno e murcho, e suas asas estavam amassadas.

Adriano continuou a observar a borboleta, pois esperava  que, a qualquer momento, as asas dela se abririam e se esticariam para  serem  capazes de suportar o peso do corpo. Mas nada aconteceu. Na verdade, a borboleta passou o resto da vida rastejando, com um corpo murcho e as asas encolhidas. Ela nunca foi capaz de voar.

Adriano, em sua vontade de ajudar, não compreendia que o casulo apertado e o esforço necessário à borboleta para passar através da pequena abertura serviam para  que o fluido do corpo da borboleta fosse para as suas asas, de modo que ela estivesse  pronta para voar quando conseguisse sair do casulo. Ao cortar a pequena abertura, Adriano acabou tirando as chances de um dia aquela borboleta conseguir voar.

Algumas vezes o esforço é justamente o que precisamos em nossa vida. Se não fossem os obstáculos, nós não seríamos tão  fortes quanto poderíamos ter sido"

Eu pedi a D'us força, mas Ele me mandou dificuldades para me fazerem forte. Eu pedi a D'us sabedoria, mas Ele me mandou problemas para eu aprender a resolver. Eu pedi a D'us prosperidade, mas Ele me mandou uma boa cabeça para pensar e músculos para eu trabalhar. Eu pedi a D'us coragem, mas Ele me mandou perigos para eu superar. Eu pedi a D'us amor, mas Ele me mandou pessoas com problemas para eu ajudar. Eu pedi a D'us favores, e Ele me mandou oportunidades. Eu não recebi nada do que pedi a D'us, mas Ele me mandou tudo o que eu precisava... 
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Nesta semana lemos duas Parashiót juntas, Behar e Bechukotai. A Parashá Behar nos ensina sobre a importante Mitzvá de Shmitá, que exige que os agricultores de Israel descansem suas terras a cada 7 anos, reforçando nossa Emuná (fé) de que todo o nosso sustento vem diretamente de D'us, e não do nosso esforço. Já a Parashá Bechukotai descreve as Brachót que recaem sobre o povo judeu quando andamos no caminho das Mitzvót, mas logo depois descreve as advertências e os consequentes castigos caso o povo judeu se desvie e abandone o pacto com D'us.

As advertências da Parashá Bechukotai terminam com um consolo: "E Eu lembrarei Meu pacto com Yaacov, e também Meu pacto com Ytzchak, e também Meu pacto com Avraham Eu lembrarei..." (Vayikrá 26:42). Se prestarmos atenção neste versículo, perceberemos que há algo interessante: a expressão "zachor" (lembrar) aparece junto ao nome do nosso patriarca Avraham e junto ao nome do nosso patriarca Yaacov, mas não aparece junto ao nome do nosso patriarca Ytzchak. Por que esta diferença?

Explica o Rav Yaakov ben Asher zt"l (Alemanha1269 - Espanha, 1343), mais conhecido como Baal HaTurim, que este versículo ressalta que D'us lembrou de maneira especial os méritos de Avraham e Yaacov pois eles cumpriram as Mitzvót tanto quando estavam em Israel quanto quando estavam fora de Israel, mas Ytzchak, que viveu apenas em Israel todos os dias da sua vida, nunca teve a oportunidade de cumprir as Mitzvót fora de Israel. O Baal HaTurim acrescenta que tanto Avraham quanto Yaacov receberam de D'us o título de "Meus servos", enquanto este título não foi concedido a Ytzchak. Mas o que nos intriga nesta explicação do Baal HaTurim é que aparentemente o fato de Ytzchak nunca ter saído de Israel foi algo negativo, que deu a ele menos méritos do que os outros patriarcas. Por que isto diminuiria seus méritos?

A pergunta fica ainda mais intrigante quando nos aprofundamos no motivo pelo qual Ytzchak nunca saiu de Israel. O Rav Shlomo Itzchaki zt"l (Rashi) (França, 1040 - 1105) explica que D'us o proibiu de sair após ele ter sido oferecido por Avraham, seu pai, como um "Korban" (sacrifício), no episódio da "Akeidat Ytzchak". A partir daquele momento Ytzchak havia se tornado uma "Olá Temimá" (oferenda de elevação perfeita), e justamente por ter atingido este nível espiritual tão elevado ele foi instruído por D'us a permanecer sempre em Israel, a "Terra Sagrada". De acordo com a explicação de Rashi, Ytzchak não podia sair de Israel por ter criado um relacionamento especial com D'us, em um nível mais elevado do que dos outros patriarcas. Então como pode ser que Avraham e Yaacov, que serviram a D'us em locais com muito menos santidade, possuíam méritos maiores do que os méritos de Ytzchak, que somente serviu a D'us em Israel?

Além disso, há outro ensinamento interessante de Rashi. Quando a Torá nos descreve as Mitzvót de Tefilin e Mezuzá (Devarim 11:18,20), Rashi explica que o propósito de uma pessoa que está fora de Israel de colocar Tefilin e de fixar Mezuzót nos batentes de sua casa é apenas para que ela não se esqueça de como cumprir estas Mitzvót, e assim possa novamente cumpri-las quando chegar o momento de voltar para Israel. O Rambam (Maimônides) (Espanha, 1135 – Egito, 1204) vai além e afirma que este conceito se aplica a todas as Mitzvót. Isto significa que, de acordo com o Rambam, o propósito de cumprirmos as Mitzvót fora de Israel é apenas para nos prevenir de esquecermos como elas devem ser cumpridas, e somente em Israel nós estamos verdadeiramente obrigados a cumpri-las. Mas como entender esta explicação do Rambam? Não há nenhum valor intrínseco em cumprir as Mitzvót fora de Israel? E isto não é contraditório com a explicação do Baal HaTurim, de que Avraham e Yaacov tinham mais méritos do que Ytzchak justamente por terem cumprido Mitzvót também quando estavam fora de Israel?

Há um Midrash (parte da Torá Oral) que nos ajuda a responder estas perguntas através de uma parábola. O Midrash conta sobre um rei que, após ter se enfurecido com sua esposa, expulsou-a do palácio e mandou-a de volta para a casa dos seus pais. O pai dela sugeriu que, mesmo enquanto ela estivesse fora do palácio, continuasse usando as roupas reais e os cosméticos. O Rav Yakov Tzvi Mecklenberg (Alemanha, 1785 - 1865) explica que o Midrash nos transmite duas mensagens. A primeira mensagem é que, ao continuar a vestindo suas roupas reais e seus cosméticos, a mulher continuaria se lembrando de todos os costumes do palácio e estaria pronta para voltar assim que fosse eventualmente chamada de volta. A segunda mensagem é que, ao manter suas roupas reais e seus cosméticos, a mulher se manteria em seu status elevado, proporcionando uma grande honra ao seu distante marido.

Ensina o Rav Yochanan Zweig que as Mitzvót efetivam nosso relacionamento com D'us. Em Israel, onde a Presença Divina é muito mais perceptível, a realidade do relacionamento proporciona ao povo judeu um sentimento de reciprocidade em seus atos. Principalmente na época em que existiam os Templos Sagrados, nos sentíamos mais próximos de D'us ao cumprirmos as Mitzvót em Israel, e este sentimento de proximidade nos preenchia e nos satisfazia. Mas fora de Israel não há este sentimento imediato de reciprocidade, pois a Presença de D'us está oculta. Como falta a reciprocidade, as Mitzvót são cumpridas como se fossem parte de um relacionamento unilateral. Por isso, a única motivação para continuar cumprindo as Mitzvót fora de Israel é o desejo de obedecer a D'us.

Este é o paralelo que podemos aplicar ao ensinamento do Rambam. Quando cumprimos as Mitzvót fora de Israel, nós demonstramos nosso desejo de continuar nosso relacionamento com D'us, e fazendo isso nós trazemos honra para Ele. Apesar de Ytzchak ter atingido elevados níveis de santidade e ter mantido durante toda sua vida um relacionamento perfeito com D'us, ele nunca enfrentou o desafio de servir a D'us sob circunstâncias nas quais o relacionamento recíproco não podia ser percebido. Já Avraham e Yaacov se sobressaíram em sua conexão com D'us e no cumprimento das Mitzvót mesmo nos momentos em que o relacionamento parecia ser unilateral. Foi justamente por isso que seus méritos tiveram um impacto muito maior sobre os seus descendentes.

É neste sentido que o Baal HaTurim ressalta que somente Avraham e Yaacov receberam o título de "escravos de D'us", pois um escravo cumpre a vontade de seu dono independente se existe um relacionamento recíproco ou não. Já Ytzchak pode ser comparado a um filho cumprindo as ordens de seu pai, que apesar de ser um relacionamento em um nível mais alto, não é tão digno de louvor quanto a dedicação de uma pessoa que aceita ser um escravo e servir seu dono mesmo sem receber a satisfação de um relacionamento recíproco.

Portanto, a Parashá nos traz um incrível ensinamento de vida. Normalmente fugimos das dificuldades, e até mesmo sofremos antecipadamente por imaginarmos os eventuais testes que podem surgir em nossas vidas. Mas a Parashá nos ensina que as dificuldades nos fortalecem e nos trazem méritos, como ensinam nossos sábios: "De acordo com a dificuldade, assim é a recompensa" (Pirkei Avót 5:26). As dificuldades nos ajudam a desenvolver os músculos físicos e "espirituais" que estavam atrofiados. Por isso, quando surgirem dificuldades em nossas vidas, temos que levantar a cabeça e enfrentá-las com coragem, sabendo que estaremos dando importantes passos para o nosso crescimento espiritual.

SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
Lv 25:1-26:2
Lv 26:3-27:34
 
 
 
 
 

domingo, 10 de maio de 2015

BLOQUEANDO AS MÁS INFLUÊNCIAS - PARASHÁ EMOR 5775

 "O príncipe de certo reinado estava às vésperas de ser coroado rei, mas de acordo com as leis locais ele deveria ser casado para poder assumir o trono. Então ele convocou todas as moças jovens do reinado para que disputassem o cargo de futura rainha. Entre as moças que se apresentaram no palácio real estava Chana, uma jovem muito bonita mas muito pobre, que mesmo sabendo que tinha poucas chances de ser escolhida, resolveu participar da disputa. Quando Chana chegou ao palácio, lá estavam todas as mais belas moças, com as mais lindas roupas e finas joias. O príncipe então anunciou o desafio:

- Será entregue um vaso com uma semente para cada uma de vocês. Aquela que dentro de seis meses me trouxer a mais bela flor cultivada será escolhida como minha esposa e futura rainha.

Chana cuidava da sua semente com muita paciência e carinho. Mas passaram-se três meses e nada brotou. Ela tentou de tudo, usou todos os métodos que conhecia, mas nada adiantava. Ela saía na rua e via as flores das outras mulheres, crescendo e se tornando cada dia mais bonitas, e desanimava. Pensou em fazer algo desonesto e plantar outra semente, já que a sua não brotava. Porém, seus pais eram pessoas muito corretas e, ao escutarem seu plano, convenceram-na de que não valia a pena mentir, mesmo que o preço fosse perder a chance de se casar com o príncipe. Os seis meses se passaram e Chana não havia conseguido cultivar nada. Consciente do seu esforço e dedicação, mesmo sem nada para mostrar ao príncipe, ela decidiu retornar ao palácio na data e hora combinadas, levando seu pequeno vaso vazio.

Todas as pretendentes estavam lá, cada uma com uma flor mais bela do que a outra, das mais variadas formas e cores. O príncipe observava tudo com muito cuidado e atenção, e as pretendentes abriam um enorme sorriso ao mostrar, orgulhosas, suas belas flores cultivadas. Quando o príncipe viu o vaso vazio de Chana, não pôde deixar de notar a expressão de vergonha e tristeza no rosto dela. Após verificar os vasos de todas as jovens que haviam comparecido, o príncipe anunciou o resultado: Chana seria sua futura esposa. Ninguém compreendeu porque ele havia escolhido justamente aquela moça que nada havia cultivado! Então ele calmamente esclareceu:

- Em um lugar onde a mentira e a enganação estão presentes com tanta força, esta moça foi a única que cultivou a flor que a tornou digna de se tornar uma rainha: a flor da verdade. As sementes que eu entreguei para todas as mulheres eram estéreis, e não poderiam ter brotado nada..."

Estamos constantemente expostos a maus exemplos. A enganação, o roubo, a desonestidade e a traição estão cada vez mais presentes no nosso cotidiano. Temos que transformar nossas casas em verdadeiros santuários, nos quais apenas os bons valores podem entrar, para tentar nos proteger de toda esta má influência. 

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Na Parashá desta semana, Emor, a Torá nos ensina algumas leis mais rigorosas que eram aplicadas apenas aos Cohanim (sacerdotes) e ao Cohen Gadol (Sumo sacerdote), por eles terem um status espiritual mais elevado e serem os responsáveis pelos serviços do Mishkan (Templo Móvel). Existiam algumas restrições em relação a que tipo de mulheres eles poderiam se casar, e também havia restrições em relação a que grau de parentesco permitia aos Cohanim participarem de um enterro, pois quando um Cohen encostava ou ficava sob o mesmo teto que um corpo, ele se impurifica e ficava proibido por alguns dias de realizar os serviços espirituais no Mishkan, até que completasse seu processo de purificação.

A Torá define que os Cohanim tinham permissão de se impurificar apenas pelos seus parentes mais próximos, como seus pais e irmãos. Já o Cohen Gadol tinha rigorosidades ainda maiores, tanto em relação ao tipo de mulheres que poderia se casar, quanto em relação a se impurificar por um parente falecido. Por sua importância espiritual nos trabalhos do Mishkan, ele não podia se impurificar nem mesmo pelos seus pais, como está escrito: "Ele (Cohen Gadol) não deve sair do Mikdash (Santuário)" (Vayikrá 21:12). Ele não podia abandonar seus serviços no Mishkan para acompanhar um enterro, e deveria continuar normalmente seus serviços no Mishkan mesmo no caso de falecimento de parentes muito próximos.

Porém, deste versículo podemos aprender outro conceito espiritual muito importante, que nos ajuda a responder um interessante questionamento. O Talmud (Brachót 59a) nos conta a história de Yochanan, o Cohen Gadol, que serviu no Beit HaMikdash (Templo Sagrado) por 80 anos e depois acabou tornando-se um "Tzduki" (seita que acreditava apenas na Divindade da Torá escrita, mas ignorava a Torá Oral, se configurando uma das primeiras linhas "reformistas" do judaísmo, e foi responsável por afastar milhares de judeus do cumprimento das Mitzvót da Torá). Mas o Talmud (Ioma 38b) afirma que uma pessoa que já viveu a maioria dos seus anos e não transgrediu, então não vai mais transgredir. Então como pode ser que depois de 80 anos servindo como Cohen Gadol, entrando todo Yom Kipur no Kodesh HaKodashim, o lugar mais sagrado do mundo, Rabi Yohanan pôde ter caído tanto espiritualmente? Além disso, nossos sábios ensinam: "As transgressões não alcançam aqueles que trazem méritos para a comunidade" (Pirkei Avót 5:18). Se durante toda sua vida o Rabi Yohanan ocupou um cargo que trazia muitos méritos para todo o povo judeu, então como no final da vida ele se tornou um "Tzduki"?

Responde o Rav Ytzchak Zilberstein shlita que podemos aprender muitas lições espirituais prestando atenção no que ocorre no mundo material. Por exemplo, existem muitos remédios no mundo que curam alguns tipos específicos de doença. Porém, quando uma doença se espalha de maneira muito forte e descontrolada, transformando-se em uma epidemia, o ar ficar completamente contaminado com o vírus da doença. Nesta situação crítica, mesmo as pessoas mais saudáveis podem acabar se contaminando. Assim também ocorre espiritualmente, pois mesmo as pessoas mais elevadas espiritualmente podem se "contaminar" com "doenças espirituais contagiosas" que existem no ar. Foi exatamente o que ocorreu com Yohanan Cohen Gadol. Em sua geração a força dos Tzdukim era tão grande que até mesmo alguém elevado espiritualmente como ele acabou caindo na armadilha do Yetzer Hará (má inclinação). Os méritos citados pelo Talmud e pelo Pirkei Avót realmente funcionam para proteger a pessoa, mas quando as influências espirituais negativas são muito fortes e constantes, então estes méritos não são suficientes para bloquear completamente os efeitos negativos.

Atualmente não temos mais os Tzdukim nos ameaçando espiritualmente, mas infelizmente vivemos em uma sociedade onde valores como honestidade e integridade são cada vez mais raros. Nos noticiários somos bombardeados com notícias de fraudes, desvios, traições e divórcios. Isto nos faz perder a nossa sensibilidade, e cada vez ficamos menos chocados ao ver injustiças e roubos. Desvios de conduta que há até pouco tempo eram considerados abomináveis acabam se tornando aceitáveis. Então como fazer para nos proteger e não nos acostumarmos com o que é errado?

Explica o Rav Ytzchak Zilberstein shlita que a resposta está nas palavras do versículo "Ele não deve sair do Santuário". Não é um ensinamento apenas para o Cohen Gadol, mas para cada judeu. Apesar de o mundo estar repleto de más influências, existe um lugar onde podemos ficar imunes e protegidos: no Beit-Midrash, o local de estudo de Torá. Lá podemos receber boas influências, podemos crescer espiritualmente e bloquear tudo o que nos derruba espiritualmente, como ensinam os nossos sábios: "Se este pilantra (Yetzer Hará) aparecer, arraste-o para o Beit-Midrash. Se for pedra ele derreterá, e se for metal ele explodirá".

Mais do que isso, precisamos também transformar nossas casas em Santuários. Precisamos tomar muito cuidado com o que permitimos que entre em nossas casas, pois tudo pode afetar nossa espiritualidade. Atualmente os programas de televisão abusam da violência e da pornografia. Os jornais repetem o dia inteiro os casos de roubos e corrupção. Sem um bloqueio consciente das informações que entram em nossas casas, estamos sujeitos a destruir nossa sensibilidade espiritual.

Quando chegarmos ao nosso Julgamento Celestial, uma das primeiras perguntas que teremos que responder será: "Você fixou tempos diários para o seu estudo de Torá?". D'us não vai nos questionar por que não passamos o dia inteiro imersos na Torá, mas Ele questionará se tivemos a claridade de que há um propósito espiritual na vida. Sofremos influências negativas o tempo inteiro, e a nossa ida diária ao Beit-Midrash se torna fundamental em nossa purificação. Não apenas pelo estudo da Torá por si só, mas também pela influência positiva que o Beit-Midrash traz sobre cada judeu que decide se abrigar ali contra as más influências.

SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
Lv 21:1-24:23, Ez 44:15-31

sábado, 2 de maio de 2015

CONTINUE ANDANDO - PARASHIÓT ACHAREI MÓT E KEDOSHIM 5775

"Nas Olimpíadas de 1992, em Barcelona, os corredores estavam preparados para a largada da semifinal da prova de 400 metros rasos masculina. Entre eles estava um jovem inglês, Derek Redmond, um dos favoritos para a grande final. Quando foi dada a largada, os competidores começaram a disputa de forma acirrada, cada um no limite do seu esforço físico. Derek estava bem na corrida, e vinha com boas chances de classificação. Eram segundos decisivos na vida daqueles que haviam treinado e se preparado tanto, e estavam ali para fazer valer o esforço de uma vida de dedicação.
 Derek Redmond tinha um motivo a mais para querer a vitória. Quatro anos antes, nas Olimpíadas de Seul, ele havia passado por cinco operações em ambos os tendões. Após muito esforço, ele havia conseguido se recuperar e participar daquela olimpíada. Porém, no meio da corrida, seu tendão direito se rompeu. Derek foi ao chão, sentindo muita dor. Era o fim do sonho, e agora restavam apenas a tristeza e a dor. As câmeras não focalizaram Derek caído, e sim o campeão Steve Lewis, que havia completado a prova em 44s50.

Mas Derek Redmond não desistiu. Determinado a concluir a prova, ele se levantou com muita dificuldade e, saltando com apenas uma das pernas, retomou a corrida, obviamente sem a menor chance de classificação. Foi quando seu pai, Jim Redmond, de 49 anos de idade, desceu a arquibancada, escalou a cerca de proteção e saltou para a pista antes que qualquer fiscal pudesse impedi-lo. Ele alcançou seu filho, abraçou-o e ajudou-o a caminhar.

A multidão, de pé, começou a aplaudir ao perceber que Derek Redmond estava participando da corrida da sua vida. O jovem corredor apoiou sua cabeça no ombro direito do pai e juntos eles percorreram o que restava da pista até a linha de chegada, sob os aplausos de incentivo da multidão de mais de 60 mil espectadores. Derek não venceu a corrida, mas naquele dia ele saiu de lá como um grande vencedor".

Dificuldades e tropeços na vida sempre existirão. Mas não podemos parar, não podemos desistir. Temos que continuar sempre buscando o nosso crescimento, nos esforçando um pouco mais a cada dia. 
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Nesta semana lemos duas Parashiót juntas, Acharei Mót e Kedoshim. Enquanto a Parashá Acharei Mót descreve os serviços feitos pelo Cohen Gadol (Sumo Sacerdote) em Yom Kipur, a Parashá Kedoshim traz várias Mitzvót "Bein Adam LeHaveiró" (entre o homem e seu semelhante), nos ensinando que, para chegarmos ao nível de sermos Kedoshim (pessoas sagradas), não podemos focar apenas no nosso relacionamento com D'us, também devemos ser muito cuidadosos no nossos relacionamento com o próximo.

Na Parashá Acharei Mót, no meio da descrição de algumas Mitzvót, a Torá nos traz um mandamento genérico: "E cumpram Minhas Leis, e guardem Meus Estatutos, para andar neles, Eu sou Hashem teu D'us" (Vayikrá 18:4). O que significa a expressão "andar" em relação às Mitzvót? E o que esta expressão acrescenta neste comando genérico de cumprir as Mitzvót da Torá?

Explica o Rav Avraham Shmuel Binyamin (Eslováquia, 1815 - 1872), mais conhecido como Ktav Sofer, que muitas vezes podemos aprender o verdadeiro significado de uma palavra estudando o seu oposto. Neste caso, o oposto de "andar" seria "ficar parado", que em hebraico é "omed". Em muitas situações o Tanach utiliza esta expressão em relação aos anjos, como em uma das visões do profeta Yeshayahu: "Os Serafim (tipo de anjo) estavam parados ("omdim") sobre ele" (Yeshaiahu 6:2). Mas qual é o sentido da Torá dizer que os anjos estavam "parados"? Segundo o Ktav Sofer, esta expressão é utilizada para ensinar que os anjos se mantêm estacionados em seu nível espiritual, isto é, eles não têm conexão com o conceito de "crescimento espiritual". Apesar de terem sido criados em um nível espiritual muito elevado, eles não crescem mais. Já a linguagem "andar" foi utilizada em relação ao ser humano, para ensinar sobre a sua possibilidade de crescer e melhorar continuamente seu nível espiritual através de seu esforço, evitando permanecer espiritualmente parado.

O mesmo conceito é utilizado pelo Ktav Sofer nas palavras iniciais da Parashá Bechukotai: "Se vocês andarem nos Meus Estatutos, e guardarem as Minhas Mitzvót, e as cumprirem" (Vayikrá 26:3). A expressão "andarem nos Meus Estatutos" significa que não é suficiente manter as Mitzvót todos os dias exatamente no mesmo nível em que as cumprimos nos dias anteriores, ao contrário, devemos constantemente crescer em nosso nível espiritual, cumprindo cada uma das Mitzvót de uma maneira melhor e mais louvável a cada dia.

Das palavras do Ktav Sofer aprendemos dois conceitos muito importantes. Em primeiro lugar, que não é suficiente nos acomodarmos na vida, achando que ao cumprir algumas Mitzvót já fazemos tudo o que é necessário no nosso trabalho espiritual. A Torá ressalta que devemos estar constantemente nos esforçando para continuar crescendo, não apenas acrescentando Mitzvót que ainda não cumprimos, mas tentando sempre melhorar ainda mais as Mitzvót que já cumprimos. Um segundo ponto interessante é perceber que, se a Torá repetidamente utiliza a linguagem de "parado" em relação aos anjos, isto significa que permanecer parado não é uma opção para os seres humanos. A Torá explicitamente nos comandou a "andar nas Mitzvót", isto é, a continuar crescendo sempre, pois apenas os anjos conseguem permanecer estacionados em sua espiritualidade sem cair para trás. Já os seres humanos, que não têm esta característica, caso não estejam crescendo, automaticamente estão caindo espiritualmente.

Este conceito também pode ser visto em uma interessante Halachá (Lei Judaica). A Torá nos ensina que em relação ao Mizbeach (Altar de Sacrifícios) há um pequeno detalhe construtivo, como está escrito: "Você não deve subir no Meu Mizbeach através de degraus" (Shemot 20:23). Como o Mizbeach tinha cerca de um metro e meio de altura, então os Cohanim subiam nele através de uma rampa. Explica o Rav Motty Berger que o final do versículo traz um motivo explícito para esta proibição de subir no Mizbeach através de degraus, que está relacionado com o conceito de "Tzniut" (recato). Porém, há outro incrível ensinamento por trás desta proibição. Quando uma pessoa está subindo uma rampa íngreme, se ela não faz nenhum esforço, a inclinação da rampa faz com que ela naturalmente caia para trás. O esforço precisa ser grande não apenas para subir, mas até mesmo para ficar parado no mesmo lugar. Já em uma escada, quando a pessoa está subindo, é possível ficar parada em um dos degraus sem o risco de cair para trás, pois a superfície onde ela está pisando é plana. Portanto, a proibição de utilizar degraus no Mizbeach nos ensina que, quando estamos fazendo o nosso Serviço Divino, não podemos ficar parados, pois nossa subida espiritual não ocorre como alguém que sobe em uma escada, e sim como alguém que sobe em uma rampa.

Mas por que uma pessoa que não faz esforços ativos para se manter espiritualmente acaba caindo, ao invés de ficar parada no mesmo nível? Pois o nosso Yetzer Hará (má inclinação) está o tempo inteiro nos puxando espiritualmente para baixo. Se a pessoa não aplica uma força ativa para crescer, então ela automaticamente cai, pois o Yetzer Hará a puxa para baixo e não há nenhuma força contrária para mantê-la estável. Já os anjos, que não têm Yetzer Hará, podem se manter constantes mesmo sem precisar de nenhum tipo de esforço.

Mas não é fácil colocar este conceito tão importante no coração. Uma das grandes dificuldades é que olhamos para pessoas que não demonstram estar fazendo nenhum esforço ativo para crescer, e mesmo assim parece que elas estão se mantendo no mesmo lugar, elas não demonstram estar se deteriorando espiritualmente. Mas a verdade é que o nosso Yetzer Hará nos derruba com sabedoria, de maneira que não conseguimos perceber. Ele vai atacando devagarzinho a pessoa, fazendo-a gradualmente se enfraquecer no cumprimento das Mitzvót. O processo é tão sutil que dificilmente é percebido pelos que estão observando-a de fora. Normalmente nem mesmo a própria pessoa está realmente consciente de seu processo lento de declínio espiritual. Ela fica tranquila, pensando que está estável, mas a verdade é que sem esforços a pessoa vai dando ao Yetzer Hará pequenos avanços que, somados, se tornam grandes derrotas.

Outra forma do Yetzer Hará nos atacar é através da força do costume. Quando uma pessoa não se esforça para melhorar em áreas onde ela ainda tem alguma deficiência, ela vai caindo cada vez mais na armadilha do hábito. E quanto mais uma pessoa repete um mau hábito, mais vai se tornando difícil se separar deste comportamento errado. Cada transgressão cria uma pequena "linha" que nos conecta um pouco mais aos maus hábitos. Aquela frágil linha, que em um primeiro instante poderia ser facilmente rompida, vai se acumulando até tornar-se uma corda grossa, muito difícil de ser arrebentada.

D'us poderia ter criado o mundo da maneira que quisesse. Portanto, tudo o que Ele criou é necessário, e tem como um de seus propósitos nos ensinar como funcionam as regras do mundo espiritual. Por exemplo, uma das coisas que D'us criou foi a força da gravidade. O que podemos aprender com a força da gravidade? Que o tempo inteiro estamos sendo puxados "para baixo". Mesmo ficar parado de pé exige esforço. Para saltarmos é necessário um esforço ainda maior. D'us nos dá, através da força da gravidade, um exemplo de que estamos o tempo inteiro sendo espiritualmente puxados para baixo. Sem nenhum esforço, acabamos no chão, sem nenhuma espiritualidade. Mesmo para nos mantermos parados de pé é necessário continuamente nos esforçar. E para subir precisamos utilizar ainda mais energia.

Aprendemos deste conceito da Parashá o quanto é fundamental nos esforçarmos ativamente para continuar crescendo espiritualmente, e que não existe para o ser humano a possibilidade de ficar parado constantemente no mesmo nível espiritual. Este ensinamento é ainda mais importante nesta época do ano. Passamos pela festa de Pessach, que representa a força de renovação do povo judeu, e estamos agora nos dias da Contagem do Omer, que fazem a conexão entre a saída do Egito e o recebimento da Torá no Monte Sinai. Da mesma forma que nestes dias o povo judeu cresceu, do pior nível de impureza até o nível de estarem prontos para receber a Torá, assim também temos a enorme oportunidade de crescer, nestes dias tão propícios, em todas as áreas espirituais. O mais importante é nunca desistir, apesar das dificuldades que surgem no nosso caminho, e continuar "andando nas Mitzvót", para conseguirmos vencer a corrida da vida.

SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
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Lv 16:1-18:30, Am 9:7-15 (Ash.), Ez. 22:1- 16 (Sef.)
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