sexta-feira, 3 de maio de 2013

O BENEFÍCIO DAS MITZVÓT - PARASHIÓT BEHAR E BECHUKOTAI 5773


"Rafael (nome fictício) era um jovem estudante de Torá. Ele estava certa vez atravessando uma movimentada rua de Tel Aviv quando foi atingido por um carro que trafegava em alta velocidade. Apesar do motorista ter tentado brecar, o impacto foi forte e Rafael teve suas pernas duramente atingidas. Ele ficou estendido no meio da rua, esperando pelo socorro médico, sentindo terríveis dores. Um policial que passava por ali correu para dar os primeiros socorros e perguntou ao rapaz:

- A ambulância já está a caminho. Há algo mais que eu posso fazer para ajudá-lo?

- Sim – respondeu Rafael, se esforçando para dar um sorriso – Por favor, comece a cumprir o Shabat.

Um casal não religioso que passava por ali naquele momento e havia se juntado à grande multidão que se aglomerava em volta do rapaz acidentado ficou admirado com a resposta dele. Apesar da dor que estava sentindo, apesar de todo o sofrimento, a primeira coisa com que ele se preocupou foi a espiritualidade do policial que havia chegado para socorrê-lo.

Emocionado com a atitude do rapaz, aquele casal decidiu acompanhá-lo até o hospital, para garantir que ele seria bem atendido e teria todo o cuidado médico necessário. Eles visitaram Rafael todos os dias durante a sua internação e se alegraram muito quando ele se recuperou completamente do acidente. Daquele dia em diante eles mudaram suas vidas e começaram a se conectar mais com a Torá e suas Mitzvót. Quando as pessoas perguntavam o motivo da mudança repentina, eles explicavam:

- Agora nós entendemos o verdadeiro significado do estudo da Torá e do cumprimento das Mitzvót. Uma pessoa que vai para a Yeshivá (Centro de estudos de Torá) se transforma, de um animal que caminha sobre duas pernas, em um ser humano de verdade, que mesmo diante de grandes sofrimentos e dificuldades, consegue se preocupar com as outras pessoas e com o seu Criador" (História Real)


********************************************


Nesta semana lemos duas Parashiót juntas, Behar e Bechukotai. A Parashá Behar fala de duas Mitzvót muito importantes: a Shmitá (Ano Sabático, que se repete a cada 7 anos, no qual todas as terras de Israel passam por um descanso, não sendo permitido nenhum tipo de trabalho agrícola) e o Yovel (Jubileu, que se repete a cada 50 anos, quando as terras em Israel voltavam aos seus antigos donos). Na Parashá Bechukotai a Torá enumera uma série de Brachót (Bençãos) guardadas ao povo judeu caso ele siga os caminhos de D'us e cumpra as Mitzvót, mas também descreve as terríveis maldições que recaem sobre o povo judeu caso a Torá e as Mitzvót sejam abandonadas.

Se observarmos as Brachót escritas na Parashá Bechukotai, perceberemos que elas estão escritas em uma aparente ordem crescente de conexão com D'us. Ele nos promete prosperidade, paz, segurança e que Sua presença repousará entre nós, isto é, no Beit Hamikdash (Templo Sagrado). Mas depois disso são enumeradas outras Brachót que necessitam de uma explicação mais profunda. Por exemplo, está escrito "Meu Espírito não rejeitará vocês... e Eu conduzirei vocês de cabeça erguida" (Vayikrá 26:11,13). Em primeiro lugar, se estamos falando das Brachót que virão caso estejamos conectados com a Torá e as Mitzvót, por que D'us tem que nos dar uma Brachá na qual Ele garante que não nos rejeitará? Se Ele já garantiu que quando cumprirmos nossa parte Sua presença repousará entre nós, não é óbvio que Ele não nos rejeitará? E por que esta Brachá é tão elevada, a ponto de estar acima da Brachá da Presença Divina repousar entre nós?

Além disso, há uma dificuldade na Brachá "Eu conduzirei vocês de cabeça erguida". O Talmud (Brachót 43b) nos ensina que é proibido uma pessoa andar de cabeça erguida, pois isto demonstra arrogância, e é considerado pelo Talmud como "derrubar os pés da Presença Divina". Mas o próprio Talmud (Baba Batra 75a), quando comenta esta Brachá, explica que "andaremos na mesma altura e estatura do Beit Hamikdash". Como entender esta aparente contradição entre a proibição de andarmos de maneira que demonstra arrogância e a Brachá de que andaremos de cabeça erguida? E qual a conexão desta Brachá com o Beit Hamikdash?

De acordo com o Targum Yonatan, o versículo "Lo Tigal Nafshi Etchem", traduzido como "Meu Espírito não rejeitará vocês", também pode ser entendido de outra maneira. A Brachá não é que D'us não nos rejeitará, e sim que nós não rejeitaremos os mandamentos de D'us, isto é, a Sua Torá. Mas mesmo com este entendimento, a dificuldade continua. Não é óbvio que, no momento que estivermos cumprindo a vontade de D'us, não rejeitaremos Suas Mitzvót? E por que isto seria considerado um dos níveis mais altos de Brachá que podemos conseguir?

Explica o Rav Yohanan Zweig que uma das principais diferenças entre o ser humano e o resto do Universo, incluindo os seres espirituais, é que o ser humano tem livre arbítrio, enquanto as outras criaturas não. Mas o que significa ter livre arbítrio? Muitas vezes pensamos que o livre arbítrio é o direito de escolher entre o certo e o errado. Porém, isto não é verdade. Livre arbítrio é a possibilidade, mas não o direito, de desrespeitar os mandamentos de D'us. É por isso que, no final de nossas vidas, prestaremos contas dos nossos atos e sofreremos as consequências das nossas escolhas erradas, pois temos a possibilidade, e não o direito, de errar.

Porém, este entendimento pode criar no ser humano um sentimento de que as coisas são impostas sobre ele. E a consequência natural deste sentimento é que, mesmo quando a pessoa cumpre suas obrigações, fica uma sensação interna de resistência, uma vontade de tirar o peso das costas. É por isto que, em alguns casos, pessoas comprometidas como a Torá podem, após alguma dificuldade específica, se afastar completamente do caminho correto. Mas será que assim devemos viver e, mesmo quando fazemos o que é o correto, ficar com uma sensação ruim, que nos incomoda? É isto o que D'us quer de nós?

Obviamente que a resposta é não. D'us não nos deu as Mitzvót para nos prejudicar, para que sejam um peso nas nossas costas e nos causem um sentimento negativo. Temos obrigações na vida, temos um objetivo, mas as Mitzvót são mais do que apenas obrigações, são benefícios que D'us nos deu. E quando chegamos neste nível de entendimento, as Mitzvót deixam de ser algo pesado. Por exemplo, foi isto o que ocorreu quando o povo judeu recebeu a Torá no Monte Sinai e todos juntos proclamaram em uma só voz: "Cumpriremos e entenderemos". O que significou esta afirmação? Que naquele momento o povo judeu havia transcendido todos os sentimentos de imposição e resistência. O que eles estavam reconhecendo no Monte Sinai é que, através do cumprimento das Mitzvót, eles perceberiam os benefícios que elas trariam para suas vidas. O povo judeu havia entendido que, mais do que uma obrigação, as Mitzvót são uma grande oportunidade para atingirmos a perfeição.

A Torá nos possibilita entender nosso potencial e definir quem nós verdadeiramente somos. Portanto, aceitar a Torá não é uma imposição, e sim, o benefício máximo concedido por D'us para toda a humanidade. E esta é a maior forma de conexão com D'us, quando conseguimos superar qualquer sentido de resistência e imposição. A Brachá de que não rejeitaremos as Mitzvót significa que, se cumprirmos nossas obrigações, atingiremos este nível de superar qualquer resistência natural ao cumprimento delas. Esta Brachá foi deixada como uma das últimas, pois retrata um dos níveis mais elevados de conexão com D'us que podemos atingir.

Mas nos falta ainda entender a contradição entre a Brachá de andar de cabeça erguida com a terrível transgressão do orgulho. Para isso, precisamos nos aprofundar no entendimento do erro de sentir orgulho. Por que andar de cabeça erguida é algo tão negativo, comparado com "derrubar os pés da Presença Divina"? Pois o orgulho é o resultado da resistência que temos em aceitar a Torá de D'us. A arrogância do ser humano vem da necessidade de brigar pelos nossos próprios direitos, ao invés de entender quais são as nossas obrigações. Mas quando a pessoa chega ao nível de um relacionamento no qual não há nenhum tipo de resistência, ela se torna um utensílio que reflete a grandeza de D'us, e andar de cabeça erguida deixa de ser uma "rebeldia" e torna-se uma santificação do Seu Nome. É por isso que o Talmud afirma que "andaremos na mesma altura e estatura do Beit Hamikdash", pois da mesma maneira que o Beit Hamikdash reflete a honra de D'us, nós também podemos fazer com que nosso relacionamento com D'us possa refletir ao mundo inteiro a Sua honra.

Muitas pessoas ainda tem medo de se aproximar da Torá e das Mitzvót. É o receio de perder uma vida de prazeres e entrar em um estilo de vida de abstinência. Mas cada vez mais este conceito equivocado vem sendo derrubado. Quando temos contato com pessoas que vivem uma vida de Torá e Mitzvót, nos salta aos olhos a harmonia, os valores verdadeiros e a santidade da família. Prazeres materiais são passageiros, duram pouco tempo. Mas o prazer de saber que estamos fazendo o que é correto dura uma vida inteira.

SHABAT SHALOM

Rav Efraim Birbojm

Lv 25:1-26:2, Je 32:6-27, Lc. 4:16-21
Lv 26:3-27:34, Je 16:19-17:14, 2 Co. 6: 14-18
http://ravefraim.blogspot.com.br/

Nenhum comentário:

Postar um comentário