O capitalismo nunca foi tão disseminado. Pergunte aos chineses o que eles acham das previsões pessimistas.
É mesmo o fim dos tempos para o capitalismo?
A civilização ocidental está condenada ao declínio?
A grande crise contemporânea demonstra o fracasso das democracias liberais
e suas economias de mercado?
O avanço da globalização piorou a distribuição de renda no mundo.
Reunidos no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, financistas,
políticos e intelectuais exibiram seu pessimismo. A nova
ordem global, diziam, está na mais completa desordem. A celebração anual de uma
“Era dos Excessos” em Davos tornou-se agora um Muro das Lamentações. O que os
economistas chamavam de “A Grande Moderação”, para sua eterna vergonha, foi na
verdade uma época de absoluta falta de moderação.
Os financistas anglo-saxões sabem de seus abusos, estimulados por bancos centrais
que promoveram excessos com dinheiro barato e regulamentação frouxa.
Sabem também de seus excessos os políticos de uma obsoleta social-democracia
europeia, que arruinou as finanças públicas de
seus países a pretexto de promover o bem-estar social. Quando celebravam seu
sucesso em Davos, exibiam suas pretensas virtudes e sabedoria. Agora, sob os
efeitos devastadores da farra do crédito e da irresponsabilidade fiscal,
financistas e políticos dissimulam hipocritamente sua contribuição à crise
contemporânea. A culpa é do capitalismo.
E o que dizer dos bem pagos intelectuais, que
sempre enfeitaram com seu brilho as celebrações dessa época de excessos? Ora,
dizem todos agora que é o fim do capitalismo. Por ressentimento com os
privilégios dos financistas? Em busca de atenção e influência? Ou pelo simples
cacoete ideológico de renovação das profecias do fim do capitalismo? Afinal,
continuará parecendo respeitável falhar miseravelmente nessas previsões desde
que na ilustre companhia de economistas como o alemão Karl Marx (1818-1883) ou o
austríaco Joseph Schumpeter (1883-1950).
Ora, nunca antes na história tantos praticaram
o capitalismo, em suas mais variadas versões. Somos um organismo vivo, a
população mundial estreitamente conectada pela teia dos mercados globais. As
democracias e os mercados são instituições extraordinariamente flexíveis.
Bombardeados por choques colossais nas últimas duas décadas, são em princípio
capazes também de extraordinários saltos evolutivos. Mas, comprimidos numa
estreita janela de tempo, agonizam sob enorme esforço de adaptação para acomodar
em seus mercados de trabalho o mergulho de 3,5 bilhões de eurasianos, deserdados
pelo colapso do socialismo. Como absorver esse formidável aumento de produção
eurasiana sem vergar ante as ameaças da desindustrialização e do desemprego em
massa? E isso está ocorrendo ao ritmo alucinante das novas tecnologias, que
agravaram as pressões de uma competição em escala global.
O capitalismo nunca foi tão disseminado.
Pergunte aos chineses o que eles acham das previsões pessimistas .
Os governos ocidentais em sua maior parte
tentam evitar as reformas exigidas para enfrentar esses novos desafios.
Recorreram a velhos e perigosos truques para manter artificialmente o
crescimento econômico. O resultado é desastroso. Estão abalados os alicerces dos
modernos regimes fiduciários. Os abusos de financistas e políticos quebraram a
confiança do público nos bancos e nos governos.
As economias avançadas chegaram ao fim de um
ciclo longo e agora estão paradas para conserto. Mas há outra dinâmica em
funcionamento: a maior prosperidade dos países emergentes, que prosseguem em
crescimento, mesmo desacelerando em meio à crise global. Não é só Bill Gates que
diz, com uma perspectiva histórica, que o “mundo está muito melhor hoje”. Os
bilhões de eurasianos que saem da miséria pelo mergulho nos mercados globais em
busca de inclusão social também têm a mesma opinião. Pergunte particularmente
aos chineses o que acham de sua inserção na ordem capitalista.
A distribuição de renda piorou em países que
perderam competitividade industrial e sopraram bolhas financeiras no processo de
globalização. Os ganhos salariais dos trabalhadores ficaram travados pela
competição global, enquanto a especulação imobiliária e financeira criava
riqueza de papel. Mas é inegável que aumentaram a produtividade e os salários
dos trabalhadores eurasianos competindo nas mesmas indústrias. A diminuição das
diferenças salariais se estende agora para os profissionais liberais e ao setor
de serviços, em função do melhor nível educacional e da maior produtividade da
mão de obra desses países. Ao contrário das previsões sombrias, com os
desenvolvidos no atoleiro e o crescimento dos emergentes, a distribuição mundial
de renda deve continuar melhorando nos próximos anos.
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