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sexta-feira, 15 de maio de 2015

DIFICULDADES TRAZEM MÉRITOS - PARASHIÓT BEHAR E BECHUKOTAI 5775

"Certo dia Adriano estava observando um casulo de borboleta quando, naquele exato momento, uma pequena abertura apareceu. Ele resolveu se sentar e observar o que aconteceria. Ele viu que a borboleta se esforçava para fazer com que seu corpo passasse através daquele pequeno buraco aberto no casulo, mas em certo momento pareceu que ela havia parado de fazer qualquer progresso e não conseguia  mais sair. Adriano decidiu ajudar a borboleta: pegou  uma tesoura e cortou o restante do casulo.  A borboleta então saiu  facilmente, mas  seu corpo estava pequeno e murcho, e suas asas estavam amassadas.

Adriano continuou a observar a borboleta, pois esperava  que, a qualquer momento, as asas dela se abririam e se esticariam para  serem  capazes de suportar o peso do corpo. Mas nada aconteceu. Na verdade, a borboleta passou o resto da vida rastejando, com um corpo murcho e as asas encolhidas. Ela nunca foi capaz de voar.

Adriano, em sua vontade de ajudar, não compreendia que o casulo apertado e o esforço necessário à borboleta para passar através da pequena abertura serviam para  que o fluido do corpo da borboleta fosse para as suas asas, de modo que ela estivesse  pronta para voar quando conseguisse sair do casulo. Ao cortar a pequena abertura, Adriano acabou tirando as chances de um dia aquela borboleta conseguir voar.

Algumas vezes o esforço é justamente o que precisamos em nossa vida. Se não fossem os obstáculos, nós não seríamos tão  fortes quanto poderíamos ter sido"

Eu pedi a D'us força, mas Ele me mandou dificuldades para me fazerem forte. Eu pedi a D'us sabedoria, mas Ele me mandou problemas para eu aprender a resolver. Eu pedi a D'us prosperidade, mas Ele me mandou uma boa cabeça para pensar e músculos para eu trabalhar. Eu pedi a D'us coragem, mas Ele me mandou perigos para eu superar. Eu pedi a D'us amor, mas Ele me mandou pessoas com problemas para eu ajudar. Eu pedi a D'us favores, e Ele me mandou oportunidades. Eu não recebi nada do que pedi a D'us, mas Ele me mandou tudo o que eu precisava... 
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Nesta semana lemos duas Parashiót juntas, Behar e Bechukotai. A Parashá Behar nos ensina sobre a importante Mitzvá de Shmitá, que exige que os agricultores de Israel descansem suas terras a cada 7 anos, reforçando nossa Emuná (fé) de que todo o nosso sustento vem diretamente de D'us, e não do nosso esforço. Já a Parashá Bechukotai descreve as Brachót que recaem sobre o povo judeu quando andamos no caminho das Mitzvót, mas logo depois descreve as advertências e os consequentes castigos caso o povo judeu se desvie e abandone o pacto com D'us.

As advertências da Parashá Bechukotai terminam com um consolo: "E Eu lembrarei Meu pacto com Yaacov, e também Meu pacto com Ytzchak, e também Meu pacto com Avraham Eu lembrarei..." (Vayikrá 26:42). Se prestarmos atenção neste versículo, perceberemos que há algo interessante: a expressão "zachor" (lembrar) aparece junto ao nome do nosso patriarca Avraham e junto ao nome do nosso patriarca Yaacov, mas não aparece junto ao nome do nosso patriarca Ytzchak. Por que esta diferença?

Explica o Rav Yaakov ben Asher zt"l (Alemanha1269 - Espanha, 1343), mais conhecido como Baal HaTurim, que este versículo ressalta que D'us lembrou de maneira especial os méritos de Avraham e Yaacov pois eles cumpriram as Mitzvót tanto quando estavam em Israel quanto quando estavam fora de Israel, mas Ytzchak, que viveu apenas em Israel todos os dias da sua vida, nunca teve a oportunidade de cumprir as Mitzvót fora de Israel. O Baal HaTurim acrescenta que tanto Avraham quanto Yaacov receberam de D'us o título de "Meus servos", enquanto este título não foi concedido a Ytzchak. Mas o que nos intriga nesta explicação do Baal HaTurim é que aparentemente o fato de Ytzchak nunca ter saído de Israel foi algo negativo, que deu a ele menos méritos do que os outros patriarcas. Por que isto diminuiria seus méritos?

A pergunta fica ainda mais intrigante quando nos aprofundamos no motivo pelo qual Ytzchak nunca saiu de Israel. O Rav Shlomo Itzchaki zt"l (Rashi) (França, 1040 - 1105) explica que D'us o proibiu de sair após ele ter sido oferecido por Avraham, seu pai, como um "Korban" (sacrifício), no episódio da "Akeidat Ytzchak". A partir daquele momento Ytzchak havia se tornado uma "Olá Temimá" (oferenda de elevação perfeita), e justamente por ter atingido este nível espiritual tão elevado ele foi instruído por D'us a permanecer sempre em Israel, a "Terra Sagrada". De acordo com a explicação de Rashi, Ytzchak não podia sair de Israel por ter criado um relacionamento especial com D'us, em um nível mais elevado do que dos outros patriarcas. Então como pode ser que Avraham e Yaacov, que serviram a D'us em locais com muito menos santidade, possuíam méritos maiores do que os méritos de Ytzchak, que somente serviu a D'us em Israel?

Além disso, há outro ensinamento interessante de Rashi. Quando a Torá nos descreve as Mitzvót de Tefilin e Mezuzá (Devarim 11:18,20), Rashi explica que o propósito de uma pessoa que está fora de Israel de colocar Tefilin e de fixar Mezuzót nos batentes de sua casa é apenas para que ela não se esqueça de como cumprir estas Mitzvót, e assim possa novamente cumpri-las quando chegar o momento de voltar para Israel. O Rambam (Maimônides) (Espanha, 1135 – Egito, 1204) vai além e afirma que este conceito se aplica a todas as Mitzvót. Isto significa que, de acordo com o Rambam, o propósito de cumprirmos as Mitzvót fora de Israel é apenas para nos prevenir de esquecermos como elas devem ser cumpridas, e somente em Israel nós estamos verdadeiramente obrigados a cumpri-las. Mas como entender esta explicação do Rambam? Não há nenhum valor intrínseco em cumprir as Mitzvót fora de Israel? E isto não é contraditório com a explicação do Baal HaTurim, de que Avraham e Yaacov tinham mais méritos do que Ytzchak justamente por terem cumprido Mitzvót também quando estavam fora de Israel?

Há um Midrash (parte da Torá Oral) que nos ajuda a responder estas perguntas através de uma parábola. O Midrash conta sobre um rei que, após ter se enfurecido com sua esposa, expulsou-a do palácio e mandou-a de volta para a casa dos seus pais. O pai dela sugeriu que, mesmo enquanto ela estivesse fora do palácio, continuasse usando as roupas reais e os cosméticos. O Rav Yakov Tzvi Mecklenberg (Alemanha, 1785 - 1865) explica que o Midrash nos transmite duas mensagens. A primeira mensagem é que, ao continuar a vestindo suas roupas reais e seus cosméticos, a mulher continuaria se lembrando de todos os costumes do palácio e estaria pronta para voltar assim que fosse eventualmente chamada de volta. A segunda mensagem é que, ao manter suas roupas reais e seus cosméticos, a mulher se manteria em seu status elevado, proporcionando uma grande honra ao seu distante marido.

Ensina o Rav Yochanan Zweig que as Mitzvót efetivam nosso relacionamento com D'us. Em Israel, onde a Presença Divina é muito mais perceptível, a realidade do relacionamento proporciona ao povo judeu um sentimento de reciprocidade em seus atos. Principalmente na época em que existiam os Templos Sagrados, nos sentíamos mais próximos de D'us ao cumprirmos as Mitzvót em Israel, e este sentimento de proximidade nos preenchia e nos satisfazia. Mas fora de Israel não há este sentimento imediato de reciprocidade, pois a Presença de D'us está oculta. Como falta a reciprocidade, as Mitzvót são cumpridas como se fossem parte de um relacionamento unilateral. Por isso, a única motivação para continuar cumprindo as Mitzvót fora de Israel é o desejo de obedecer a D'us.

Este é o paralelo que podemos aplicar ao ensinamento do Rambam. Quando cumprimos as Mitzvót fora de Israel, nós demonstramos nosso desejo de continuar nosso relacionamento com D'us, e fazendo isso nós trazemos honra para Ele. Apesar de Ytzchak ter atingido elevados níveis de santidade e ter mantido durante toda sua vida um relacionamento perfeito com D'us, ele nunca enfrentou o desafio de servir a D'us sob circunstâncias nas quais o relacionamento recíproco não podia ser percebido. Já Avraham e Yaacov se sobressaíram em sua conexão com D'us e no cumprimento das Mitzvót mesmo nos momentos em que o relacionamento parecia ser unilateral. Foi justamente por isso que seus méritos tiveram um impacto muito maior sobre os seus descendentes.

É neste sentido que o Baal HaTurim ressalta que somente Avraham e Yaacov receberam o título de "escravos de D'us", pois um escravo cumpre a vontade de seu dono independente se existe um relacionamento recíproco ou não. Já Ytzchak pode ser comparado a um filho cumprindo as ordens de seu pai, que apesar de ser um relacionamento em um nível mais alto, não é tão digno de louvor quanto a dedicação de uma pessoa que aceita ser um escravo e servir seu dono mesmo sem receber a satisfação de um relacionamento recíproco.

Portanto, a Parashá nos traz um incrível ensinamento de vida. Normalmente fugimos das dificuldades, e até mesmo sofremos antecipadamente por imaginarmos os eventuais testes que podem surgir em nossas vidas. Mas a Parashá nos ensina que as dificuldades nos fortalecem e nos trazem méritos, como ensinam nossos sábios: "De acordo com a dificuldade, assim é a recompensa" (Pirkei Avót 5:26). As dificuldades nos ajudam a desenvolver os músculos físicos e "espirituais" que estavam atrofiados. Por isso, quando surgirem dificuldades em nossas vidas, temos que levantar a cabeça e enfrentá-las com coragem, sabendo que estaremos dando importantes passos para o nosso crescimento espiritual.

SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
Lv 25:1-26:2
Lv 26:3-27:34