sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

NÃO PERCA A CABEÇA - PARASHÁ VAYECHI 5772

"O Rav Moshe Cordovero foi um dos cabalistas mais notáveis de todos os tempos. Passou a maior parte da sua vida na cidade sagrada de Tzfat, o lar da Cabalá. Escreveu obras incríveis, com comentários sobre a parte oculta da Torá. Um dos seus maiores alunos, o Arizal, que também se tornou um grande cabalista, viu no dia do enterro do Rav Moshe Cordovero uma coluna de fogo que subia do túmulo e ia até o céu. Perguntou, entre a multidão que acompanhava o enterro, se mais alguém estava vendo algo incomum. Um rapaz jovem, de aproximadamente quinze anos, se aproximou e disse que também conseguia enxergar uma coluna de fogo que ia até o céu. O Arizal entendeu que aquele rapaz tinha um enorme potencial e estava em um alto nível espiritual. Por isso, se interessou em adotar o rapaz e ensiná-lo Torá.No dia seguinte, o rapaz se apresentou logo cedo na casa do Arizal, animado para iniciar os estudos. Ele estava eufórico com a possibilidade de receber conhecimentos de Torá diretamente do famoso Arizal. Porém o Arizal, através de seu Ruach Hakodesh (percepção espiritual aguçada), descobriu que o rapaz, durante a noite, havia cometido uma gravíssima transgressão. Profundamente decepcionado, o Arizal falou ao rapaz:
- Me desculpe, mas você terá que ir embora, pois você perdeu seu nível espiritual elevado. Infelizmente não poderei mais te ensinar Torá.
E aquele rapaz, apesar de ter um enorme potencial, deixou de receber, para sempre, todo o conhecimento magnífico que o Arizal tinha para transmitir"
Todos os dias temos que nos questionar se estamos cumprindo o nosso potencial ou se, através de atos equivocados, estamos deixando passar grandes possibilidades de crescimento espiritual.
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Nesta semana terminamos o primeiro livro da Torá, Bereshit, com a Parashá Vayechi, que descreve a morte de Yaacov aos 147 anos. Apesar de ter morrido no Egito, Yaacov foi enterrado na Mearat Hamachpelá, em Israel, junto com seus antepassados, conforme havia pedido aos seus filhos. D'us também havia garantido a Yaacov que ele seria enterrado na terra de Israel, como está escrito: "Eu descerei com você ao Egito, e Eu certamente trarei você de volta" (Bereshit 46:4). Mas houve alguém que tentou estragar os planos de D'us: Essav.
Quando Yaacov recebeu a Brachá de primogenitura no lugar de Essav, sua mãe Rivka descobriu que Essav queria matá-lo. Então ela chamou Yaacov e mandou-o fugir, argumentando: "Por que eu deveria me enlutar por vocês dois no mesmo dia?" (Bereshit 27:45). Rashi, famoso comentarista da Torá, explica que estas palavras de Rivka eram proféticas e realmente se cumpriram. Apesar de Yaacov e Essav não terem morrido no mesmo dia, eles foram enterrados no mesmo dia. Como isto aconteceu?
Há um interessante Midrash (parte da Torá Oral) que descreve detalhes do enterro de Yaacov. Yossef e seus irmãos, como haviam se comprometido, viajaram do Egito para Israel levando o caixão de Yaacov, seguido por uma multidão de pessoas que queriam dar a Yaacov as últimas honrarias. Mas quando o cortejo fúnebre chegou à Maarat Hamachpelá, local onde estavam enterrados os outros patriarcas e matriarcas, na porta estava Essav, querendo impedir o enterro, argumentando que era dele o direito de ser enterrado lá por ser o filho primogênito. Os filhos de Yaacov argumentaram que Essav havia vendido sua primogenitura e, portanto, também o direito de ser enterrado na Mearat Hamachpelá, mas Essav exigiu um documento que comprovasse a venda. O documento existia, mas estava no Egito, o que na época significava alguns dias de viagem. Como o impasse não se resolvia através do diálogo, Naftali, um dos filhos de Yaacov, partiu para o Egito em busca do documento. Enquanto isso, o corpo de Yaacov ficou exposto à vergonha, diante de uma multidão que aguardava seu enterro.
Porém, houve alguém que não participou de toda aquela discussão. Dan, um dos filhos de Yaacov, tinha um filho surdo chamado Chushin. E justamente por ser surdo ele não escutou toda a discussão. Quando viu que o enterro demorava mais do que o normal, perguntou o motivo e foi informado de que Essav, o malvado, impedia o enterro com argumentos mentirosos, causando uma grande vergonha para seu avô Yaacov. Sem pensar duas vezes, Chushin pegou um pedaço de madeira e golpeou Essav, que morreu imediatamente. Somente então Yaacov pôde ter um enterro digno.
Mas o Midrash conta um detalhe muito intrigante sobre a morte de Essav. Com o golpe que recebeu de Chushin, sua cabeça rolou até a Mearat Hamachpelá e lá foi enterrada, enquanto seu corpo foi enterrado do lado de fora. O que significa esta informação adicional do Midrash? Não era suficiente apenas dizer que Essav morreu?
Na verdade o Midrash está dizendo algo mais profundo, e não apenas nos relatando a morte física de Essav. A cabeça representa as nossas decisões racionais, o nosso potencial, enquanto o corpo representa as nossas vontades e desejos. Essav tinha a cabeça de um patriarca, isto é, um gigantesco potencial, como o de Yaacov. Um exemplo foi a maneira perfeita como ele cumpriu a Mitzvá de "Kibud Av Ve Em" (Honrar os pais). Por isso sua cabeça, que representava seu potencial, teve o mérito de ser enterrada na Mearat Hamachpelá, junto com os outros patriarcas. E o que significa que o corpo de Essav foi enterrado fora? Que, apesar de seu gigantesco potencial, ele não conseguiu colocá-lo em prática. Utilizou suas forças e os meios que D'us lhe deu apenas para buscar prazeres materiais. Ele desperdiçou a chance de cumprir sua missão no mundo e elevar a humanidade inteira junto com ele.
O Rav Yaakov Weinberg zt"l traz uma prova da grandeza de Essav nos versículos da Haftará da Parashá Toldot (A Haftará é um trecho do Livro dos Profetas e Escrituras). Assim está escrito: "Não era Essav irmão de Yaacov? - Palavras de D'us - mas Eu amei Yaacov" (Malachi 1:2). O versículo ressalta que D'us tinha duas opções, isto é, Essav era uma opção, porém D'us escolheu Yaacov.
Mas deste versículo ficam algumas perguntas. Por que o profeta Malachi não falou o motivo da escolha de Yaacov? Além disso, na continuação das palavras do profeta, ele faz uma dura crítica aos Cohanim (sacerdotes) que serviam no Templo em sua época, que desprezavam o Serviço Divino. Qual a conexão desta crítica com a escolha de Yaacov ao invés de Essav?
A resposta está no versículo "E comeu, bebeu, se levantou e se foi. E Essav desprezou a primogenitura" (Bereshit 25:34). A característica de Essav que o afastou de D'us foi que ele desprezou o Serviço Divino, desprezou sua espiritualidade, teve preguiça de cumprir seu potencial. E esta foi a bronca que o profeta deu nos Cohanim, que também desprezaram o Serviço Divino. Por isso o profeta juntou os dois assuntos, para nos ensinar que precisamos ter um cuidado especial na forma como fazemos o nosso Serviço a D'us, pois foi justamente o motivo pelo qual D'us rejeitou Essav e escolheu Yaacov. Pois enquanto Essav desprezou sua espiritualidade, Yaacov e seus descendentes demonstraram grande respeito em relação ao Serviço Divino.
É interessante ver um movimento cada vez maior de pessoas procurando pelo estudo da Kabalá. Por que este interesse tão grande pelo misticismo judaico? Por que o lado oculto atrai tanto as pessoas? Por um lado, a busca pelo misticismo é a vontade de conhecer um pouco mais sobre o que nossos olhos não podem enxergar: o mundo espiritual. Por outro lado, este "fogo" pelo místico é uma forma das pessoas se sentirem espiritualizadas sem precisar de esforço. Cria-se uma falsa idéia de que não é necessário cumprir Mitzvót para se conectar com D'us, o importante é apenas assistir algumas aulas de Kabalá e assim já seremos seres espirituais. Infelizmente isto é uma auto-enganação, e vem da nossa preguiça de buscarmos os caminhos corretos. A única forma de crescermos espiritualmente é através do esforço, do cumprimento das Mitzvót, conforme está explícito na Torá.
Atualmente o serviço a D'us é representado principalmente pela Tefilá (reza). Portanto é na nossa Tefilá e no cumprimento das Mitzvót que podemos mostrar para D'us que ainda somos merecedores de sermos escolhidos no lugar de Essav. Mas se fizermos nossa Tefilá sem concentração, tivermos preguiça de acordar cedo para rezar ou chegarmos cansados de noite e não tivermos vontade de rezar, estaremos demonstrando que também estamos desprezando nosso Serviço Divino. Temos um potencial a ser concretizado, e a única forma é através do nosso esforço. Somente assim poderemos ter a certeza de que, no final de nossas vidas, não teremos uma cabeça de Yaacov e um corpo de Essav.
SHABAT SHALOM
R' Efraim Birbojm
Gn. 47:28-50:26, 1 Rs. 2:1-12, 1 Pe. 1:1-9

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