"Um rei havia presenteado sua filha com um belo colar de diamantes, mas certo dia o colar desapareceu. O rei, desesperado, anunciou uma grande recompensa para quem o encontrasse. Naquela mesma semana Jorge resolveu voltar caminhando para casa. Quando chegou perto de uma área industrial, passou por um rio poluído, sujo e com um cheiro insuportável. Jorge então viu algo brilhando no fundo do rio. Curioso, chegou mais perto e viu que era o colar de diamantes da princesa. Quis pegá-lo para receber a recompensa e enfiou a mão naquela água imunda, mas não conseguiu alcançá-lo. Entrou no rio e sujou toda a roupa, mas ainda assim não alcançou o colar. Estava tão obcecado que decidiu mergulhar no rio imundo, porém não alcançava o colar. Ficou desolado, pois estava imundo e o colar continuava no fundo do rio, tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe.
Caminhava cabisbaixo quando encontrou Aharon, um homem muito sábio, que percebeu que havia algo errado. Aharon perguntou qual era o problema, mas Jorge não queria compartilhar o segredo, com medo que Aharon iria pegar o colar escondido. Mas Aharon insistiu e Jorge acabou explicando o mistério do colar que podia ser visto mas não podia ser alcançado. Aharon abriu um sorriso e disse:
- Vou te dar uma dica preciosa. Ao invés de olhar para baixo, para o rio imundo, tente olhar para cima. Assim você vai conseguir pegar o colar valioso.
Jorge não entendeu as palavras de Aharon. O que significava olhar para cima, se ele estava procurando um colar de diamantes no fundo do rio? Porém, como não tinha nada a perder, voltou ao local e olhou para cima. Não acreditou quando viu que sobre o rio se estendiam os galhos de uma árvore, e na ponta de um deles estava pendurado o colar. Entendeu que, até aquele momento, havia apenas tentado pegar o simples reflexo do colar verdadeiro".
Buscar preenchimento completo nos bens materiais é como mergulhar em um rio poluído e imundo, pois é um mero reflexo da felicidade verdadeira que existe no mundo espiritual.
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Nesta semana lemos a Parashá Vaieshev, que fala sobre Yossef, filho de Yaacov, e seus irmãos. A Parashá começa com Yossef descrevendo aos irmãos seus dois sonhos, que causaram um grande desgaste no relacionamento entre eles. Assim ele descreveu seu primeiro sonho: "Nós estávamos atando feixes no meio do campo, e eis que meu feixe se levantava e ficava em pé, e seus feixes se juntavam em volta e se curvaram diante do meu feixe" (Bereshit 37:7). E assim ele descreveu seu segundo sonho: "O sol, a lua e onze estrelas se curvavam diante de mim" (Bereshit 37:9). É interessante perceber que, apesar dos sonhos terem sido muito parecidos, a reação dos irmãos de Yossef foi completamente diferente. Depois do primeiro sonho a Torá diz que os irmãos de Yossef o odiaram ainda mais, porém depois do segundo sonho a Torá diz que os irmãos de Yossef sentiram inveja dele. Por que esta diferença?
Responde o Rav Yossef Dov Soloveitchik (Bielorússia, 1820 - 1892), mais conhecido como Beit Halevi, que os sonhos têm entre si uma diferença sutil, mas que muda completamente o significado deles. No primeiro sonho não foram os irmãos que se curvaram para Yossef, e sim os feixes deles que se curvaram para o feixe de Yossef. Já no segundo sonho os próprios irmãos, representados pelas onze estrelas, se curvaram diante de Yossef. Este pequeno detalhe foi suficiente para fazer uma enorme diferença na reação dos irmãos de Yossef.
Explica o Beit Halevi que os dois sonhos representavam visões proféticas sobre duas áreas nas quais os irmãos de Yossef seriam subordinados e inferiores a ele. Os feixes do campo do primeiro sonho representavam a futura superioridade que Yossef teria sobre seus irmãos em relação ao sucesso no Olam Hazé (mundo material). Os feixes dos irmãos se curvarem diante do feixe de Yossef significava que eles seriam dependentes de Yossef em seu sustento físico. Porém, o sucesso no mundo material não faz com que a pessoa seja intrinsecamente superior às outras, somente significa que ela tem mais posses. Uma pessoa milionária não é melhor e nem está em um nível mais alto do que uma pessoa muito pobre. É por isso que a Torá diz que os feixes se curvaram, isto é, as posses físicas dos irmãos de Yossef estariam subordinadas às posses físicas de Yossef, mas não a essência deles. Já o segundo sonho representava a visão profética da superioridade espiritual que Yossef teria sobre seus irmãos. As estrelas fazem parte das "Mazalot" (constelações), que exercem muita influência sobre as características de cada ser humano. Portanto, neste segundo sonho foram os irmãos mesmos que se curvaram diante de Yossef. O sonho mostrava que Yossef também chegaria a uma realização espiritual maior do que seus irmãos.
Esta explicação nos ajuda a entender a diferente reação dos irmãos de Yossef a cada um dos sonhos. O ódio surge quando alguém se ressente da atitude de outra pessoa, enquanto a inveja surge quando alguém se sente inferior em relação a outra pessoa. Os irmãos de Yossef o odiaram após o primeiro sonho, pois se ressentiram ao entender que dependeriam dele para obter seu sustento e que seriam governados por ele. Porém, eles não sentiram inveja, pois o fato de Yossef ter mais riquezas não os fez se sentirem inferiores. Eles viam as realizações e conquistas materiais como algo externo à pessoa e, portanto, algo que não era digno de inveja. Mas após ouvirem o segundo sonho, a Torá descreve que eles sentiram inveja, pois o sonho revelava que Yossef chegaria a um nível espiritual superior ao nível deles. Como as conquistas espirituais são algo intrínseco da pessoa, isto despertou inveja nos irmãos, pois os fez se sentirem inferiores.
De acordo com o Rav Yehonasan Gefen, dos ensinamentos do Beit Halevi aprendemos duas lições importantes. A primeira lição é que as posses materiais de uma pessoa não definem sua verdadeira grandeza. A Torá nos ensina que uma pessoa que tem muito dinheiro deve ser respeitada, mas não devemos invejar a riqueza de ninguém, pois o dinheiro não é o medidor do valor real de uma pessoa. Somente o nível espiritual determina a verdadeira grandeza de alguém, e isto sim é digno de ser invejado.
Infelizmente vivemos em uma sociedade que dá muita ênfase para as posses materiais. As pessoas não são medidas pelo que elas são, e sim pelo que elas têm. Por exemplo, vemos que as pessoas em geral são muito reservadas em relação à sua situação financeira. Por que? Quando algo é muito importante para uma pessoa, ela não gosta de revelar aos outros, pois considera como sendo parte da sua essência. É por isso que a maioria das pessoas não revela nem mesmo aos amigos seu salário e o valor do seu apartamento. Esta visão equivocada é tão penetrante que "contamina" até mesmo pessoas mais conectadas com a espiritualidade, tornando difícil não dar importância ao status financeiro. Uma solução é aprendermos com os Gdolei HaDor (grandes sábios da nossa geração), como o Rav Chaim Kanievsky e o Rav Aharon Leib Shteinman, rabinos que têm prestígio e poder suficientes para serem pessoas ricas e ostentadoras, mas que preferiram viver vidas simples, sem nenhum tipo de luxo. Sob as mãos deles passam milhares e milhares de dólares, mas tudo é destinado à caridade. E mesmo sendo simples e pobres, eles são os gigantes espirituais da nossa geração, respeitados por todos. Quanto mais claridade tivermos do nosso verdadeiro valor, mais força teremos para lutar contra esta má inclinação.
A verdade é que esta luta já é antiga dentro do povo judeu. Na próxima 3ª feira de noite (16/12) começa a festa de Chánuka, época em que recordamos a milagrosa vitória do povo judeu sobre os gregos, que constituíam o maior e mais poderoso império da época. Porém, maior do que a vitória militar foi a vitória espiritual. Os gregos trouxeram para Israel sua filosofia, baseada na busca de prazeres físicos, na perfeição do corpo e na supervalorização dos nossos bens materiais, contaminando o povo judeu e tentando arrancar nossa espiritualidade através da assimilação. Mas uma parte do povo não se intimidou com a força física nem com a "gloriosa" filosofia grega, e mesmo sendo um pequeno grupo, estes judeus foram valentes e se rebelaram contra o domínio grego. Milagrosamente eles conseguiram infligir ao poderoso exército grego pesadas baixas, até que os gregos desistiram e partiram. Foi a vitória do espiritual sobre o material, da santidade sobre a impureza. É esta vitória que recordamos quando acendemos, durante os 8 dias de Chánuka, não apenas as velas das nossas Chanukiót, mas os nossos próprios corações. Pois apenas uma batalha foi vencida contra os gregos, porém a luta continua. Depende de nós expulsarmos do mundo a escuridão grega. A escuridão que nos cega e não nos deixa perceber que o verdadeiro valor de um ser humano é o que ele é, e não o que ele tem.
SHABAT SHALOM e CHÁNUKA SAMEACH
Rav Efraim Birbojm
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