"Um senhor de idade foi morar com o filho, a
nora e o neto de quatro anos. Por causa da idade avançada, as mãos do velhinho
eram trêmulas e a sua visão já estava embaçada, e isso o atrapalhava muito na
hora de comer. A comida muitas vezes caía no chão e a bebida sempre acabava
derramada na toalha. Além disso, muitas vezes ele deixava o prato de vidro cair
no chão, espatifando-o. O filho e a nora começaram a ficar profundamente
irritados com a sujeira, até que um dia a nora comentou com o marido:
-
Precisamos tomar alguma providência a respeito do seu pai. Isto não pode
continuar. Já tivemos suficiente bebida derramada, pratos quebrados e comida
espalhada pelo chão!
O marido concordou, e decidiram então tomar uma
providência: daquele dia em diante o velhinho comeria em um canto da cozinha,
numa pequena mesa isolada, enquanto o restante da família continuaria fazendo as
refeições na mesa principal. Além disso, sua comida passaria a ser servida numa
tigela de madeira. E assim fizeram, isolaram o pobre velhinho, que comia sempre
sozinho e humilhado. E por estarem tão distantes do velhinho na hora da comida,
ninguém podia perceber as lágrimas em seus olhos. As únicas palavras que lhe
diziam eram broncas e gritos quando ele deixava um talher ou a comida cair no
chão. O menino de quatro anos de idade assistia a tudo em silêncio.
Certa
noite, antes do jantar, o pai percebeu que o garoto estava no chão, manuseando
um pedaço de madeira. O pai foi até ele e lhe perguntou o que estava fazendo com
aquela madeira. O menino respondeu:
- Eu estou fazendo uma tigela para
você e para a mamãe comerem quando vocês também ficarem velhos.
O garoto
de quatro anos de idade sorriu e voltou ao trabalho. Aquelas palavras tiveram um
impacto tão grande nos pais que eles ficaram mudos, e lágrimas começaram a
escorrer de seus olhos. Naquela mesma noite o pai tomou o avô pelas mãos e
gentilmente conduziu-o à mesa da família. Daquele dia em diante ele voltou a
comer todas as refeições com a família. E o marido e a esposa já não se
importavam mais quando um garfo caía, o leite derramava ou a toalha da mesa
ficava suja"
Temos que tomar cuidado de como cuidamos dos nossos velhos,
pois um dia também seremos
velhos...
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A
Parashá desta semana, Shemini, nos ensina sobre a inauguração do Mishkan (Templo
Móvel). Por sete dias Moshé fez os serviços do Mishkan, mas no oitavo dia ele
consagrou Aaron e seus filhos como Cohanim (sacerdotes), e a partir deste dia
eles e seus descendentes foram para sempre os responsáveis pelo serviço do
Templo. E assim começa a Parashá: "E foi no oitavo dia, Moshé convocou Aaron,
seus filhos e os anciãos de Israel" (Vayikrá 9:1). Entendemos porque Aron e seus
filhos foram chamados, já que seriam consagrados como Cohanim. Mas por que a
Torá relata que os anciãos também foram chamados?
Vivemos em uma
sociedade onde os mais velhos são desprezados e deixados de lado. As empresas
costumam "aposentar" seus funcionários após os 60 anos pois querem "renovar" seu
quadro de funcionários, e a pessoa praticamente perde seu valor na vida. Existe
um problema que atualmente atinge o mundo inteiro, desde países pobres até os
mais ricos: com as melhorias no campo da medicina e o baixo nível de natalidade,
a população mundial tem envelhecido nos últimos anos, e com isso a população
economicamente ativa vem diminuindo muito, causando problemas para a previdência
social. Francis Crick, ganhador do prêmio Nobel de química pela descoberta do
DNA, foi certa vez entrevistado pela revista "Nature" e questionado sobre como
este problema poderia ser resolvido. Francis Crick sugeriu que pessoas com mais
de 80 anos que ficassem doentes e não tivessem condições de pagar seu próprio
tratamento médico não deveriam mais ser atendidas nos hospitais públicos,
deveriam ser deixadas em uma maca, em um canto do hospital, para não
atrapalharem os outros doentes. O que Francis Crick quis dizer é que a sociedade
moderna rotula as pessoas de acordo com o quanto contribuem financeiramente. Em
resumo, os velhos não servem para nada e devem ser ignorados. Será que esta é a
visão judaica?
A palavra "ancião" em Lashon Hakodesh (língua sagrada na
qual foi escrita a Torá) é "Zaken". Ensinam nossos sábios que a palavra "Zaken"
vem das palavras "Zé she KaNá chochmá" (aquele que adquiriu sabedoria). Mas será
que todo ancião tem sabedoria? A mesma pergunta surge quando observamos uma das
613 Mitzvót da Torá: "Na presença de uma pessoa idosa você deve levantar-se e
você deve honrar a presença de um sábio" (Vayikrá 19:32). Por que a Torá traz
junto a Mitzvá de honrar um idoso com a Mitzvá de honrar um sábio? Explicam os
nossos sábios que existem diversos tipos de sabedoria. Por exemplo, "Chochma" é
a capacidade de formação de idéias, "Biná" é a capacidade de análise dedutiva,
"Daat" é a capacidade compreender as coisas de forma mais profunda. E além
destes três tipos de sabedoria existe uma quarta, que é a "Zikná", a experiência
de vida. As primeiras três sabedorias podem ser obtidas através do estudo e do
esforço, mesmo por pessoas jovens. Mas a "Zikná" é a sabedoria que apenas os
anciãos têm.
É por isso que a Torá ressalta que, na inauguração do
Mishkan, Moshé também chamou os anciãos, para mostrar que segundo o judaísmo
devemos honrar e respeitar os mais velhos por sua sabedoria de vida. E assim
dizia o Rabi Akiva, um dos maiores rabinos de todas as gerações: "O povo judeu
se assemelha a um pássaro. Da mesma forma que um pássaro não pode voar sem suas
asas, o povo judeu também não poderia fazer nada se não fossem seus anciãos".
Segundo o judaísmo, uma sociedade que não valoriza seus anciãos não sobrevive.
Talvez isso ajude a explicar por que a sociedade moderna, com pouco mais de 200
anos, já está tão decadente, enquanto o judaísmo continua com seu brilho e vigor
há mais de 3.000 anos.
A Torá nos ensina a recompensa de poucas Mitzvót.
Uma das exceções é a Mitzvá de "Honrarás teu pai e tua mãe", na qual a Torá
descreve que a pessoa recebe "Arichut Iamim" (alongamento dos seus dias). Mas a
linguagem utilizada é estranha, pois ao invés de "alongamento dos dias" deveria
estar escrito "multiplicação dos dias"! Uma das explicações é que os pais, por
já terem passado por muitas experiências, já adquiriram muita sabedoria de vida.
Portanto, aquele que honra seus pais e sabe escutar seus conselhos "alonga seu
dia", isto é, aprende com a experiência de vida dos pais e perde menos tempo
cometendo erros. Por isso sobra mais tempo para fazer o que realmente precisam
fazer na vida.
É verdade que jovens recém saídos da universidade podem
ter mais conhecimentos tecnológicos, mas para tomar decisões corretas na vida é
necessário mais do que conhecimento técnico, é necessário experiência de vida, e
isso nenhum jovem tem. Portanto, respeite e valorize os mais velhos.
"Não
teremos tempo de cometer todos os erros. Que possamos então aprender com os
erros e acertos dos outros"
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com.br/search/label/Parash%C3%A1%20Shemini
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