"Paulo entrou no avião já se preparando para a longa viagem com destino a Israel. Seriam quase 15 horas de vôo até o destino final. Apertou o cinto de segurança e, para relaxar um pouco, abriu seu guia de turismo sobre Israel, que havia comprado para aproveitar ao máximo a estadia.
No meio da viagem ele olhou com curiosidade para o senhor que estava sentado ao seu lado, que parecia muito à vontade no avião. Ele demonstrava já conhecer todas as diversões a bordo. Jogava jogos, assistia filmes, cochilava, passeava para conversar com outros passageiros, almoçava, comia salgadinhos na cozinha, estava bastante enturmado com os outros passageiros e com os comissários de bordo.
Paulo não quis parecer antipático e, apesar de estar cansado, tentou puxar conversa com ele. Descobriu que o senhor se chamava Gabriel e era um grande empresário de São Paulo. Paulo perguntou, curioso:
- Para onde você está indo?
Gabriel pareceu confuso com a pergunta. Ele simplesmente não sabia para onde estava indo. Na verdade, até aquele momento não havia parado para pensar naquilo. Paulo ficou irritado com a falta de claridade daquele sujeito e falou, indignado:
- Mas como o senhor está em um avião e não sabe nem mesmo para onde está indo? O senhor é louco?
- Não fique irritado, mas eu não estou preocupado com isso. Eu estou preocupado em aproveitar a viagem. Assisti dois filmes excelentes, ganhei três vezes jogando contra o computador e conheci muita gente interessante. Sem falar na comida, que estava uma delícia..."
Podemos achar que Gabriel é um louco, um lunático. Mas será que não fazemos o mesmo com nossas vidas? Assistimos bons filmes, comemos uma boa comida, conhecemos muita gente interessante. E depois, o que acontecerá? Para onde estamos indo? E o que estamos fazendo para chegar ao nosso destino verdadeiro?
Antes de pedir em Rosh Hashaná mais um ano de vida, antes de pedir a D'us para continuar nesta "viagem" chamada vida, precisamos saber para onde esta viagem nos levará.
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Rosh Hashaná está chegando. Para muitos, vem junto com uma sensação ruim. A primeira idéia que nos vem à cabeça é que seremos julgados por D'us, o Rei do Universo, e se não tivermos nos comportado bem, seremos duramente castigados. Infelizmente esta é uma visão incompleta de Rosh Hashaná, influenciada por muitos conceitos não judaicos. Por exemplo, nosso conceito de castigo é de um D'us bravo, descontando Sua raiva nas pessoas. É um conceito completamente equivocado, que nos afasta do verdadeiro significado espiritual de Rosh Hashaná, uma das festas mais bonitas e significativas do ano.
Há um versículo no final da Torá, sempre lido perto da festa de Rosh Hashaná, que nos intriga: "Eu chamo os Céus e a terra hoje para servirem de testemunhas contra vocês: Eu coloco diante de vocês a vida e a morte, a Brachá (benção) e a Klalá (maldição); escolha a vida, para que viva você e sua descendência" (Devarim 30:19). Qualquer ser humano em condições psicológicas normais sabe que devemos escolher a vida. Então por que a Torá precisa escrever "escolha a vida", como se D'us estivesse fazendo um pedido para nós? Não é Ele Quem decide tudo?
Em Rosh Hashaná comemoramos e revivemos a criação do ser humano, o ápice de toda a Criação. Portanto, para entender Rosh Hashaná, precisamos ter muito claro o propósito da vida. Segundo o livro Messilat Yesharim (Caminho dos Justos), de autoria do Rav Moshe Chaim Luzzato z"l, o ser humano foi criado com o único propósito de sentir prazer, sendo que o único e verdadeiro prazer é a proximidade com D'us. Mas se Ele nos desse este prazer de maneira gratuita, sem nenhum mérito, sentiríamos uma vergonha eterna por termos recebido algo que não conquistamos. Por isso Ele nos criou com livre arbítrio, para poder nos dar mérito por nossas escolhas corretas. O livre arbítrio é a habilidade de escolher entre viver na realidade ou em uma ilusão. Explica o Rav Noach Weinberg z"l que surge então um aparente dilema: D'us criou o mundo com o único propósito de nos fazer o bem. Por outro lado, Ele não pode nos dar esta bondade a não ser que a meritemos.
No dia 1º do mês judaico de Tishrei o ser humano foi criado. Todo ano este processo se repete e D'us nos permite ganhar o mérito de sermos recriados. Em Rosh Hashaná D'us nos julga se estamos escolhendo a realidade ou não. Se nós fazemos as escolhas corretas, Ele nos recria dentro de um ano de vida, isto é, viver dentro da realidade. Mas se escolhemos ficar dormindo, Ele nos recria dentro de um ano de morte, isto é, de desconexão, de sono espiritual, de ilusão, um ano sem sentido para a vida e sem verdade. D'us não faz isto para nos castigar, e sim por amor. Ele quer que tenhamos sucesso, mas a escolha final precisa ser nossa.
Rosh Hashaná é, portanto, o aniversário do livre arbítrio, quando devemos novamente reafirmar a nossa escolha: estar entre os vivos, que vivem uma vida com sentido, ou entre os mortos, que vagam todo o tempo dormindo acordados. Pelo fato da escolha estar totalmente em nossas mãos, em Rosh Hashaná D'us nos pede: "Eu criei o mundo para te dar prazer e felicidade. Por favor, Me deixe fazer esta bondade. Escolha a vida".
Outro ponto central de Rosh Hashaná é fazer de D'us o nosso Rei. Isto também nos traz um sentimento negativo, pois os reis que conhecemos são tiranos, egoístas e gananciosos, sedentos por poder, que subjugam as massas com ameaças e violência. Mas o conceito judaico de rei é justamente o contrário. O rei é alguém que ama e se importa com seu povo. Sua preocupação é apenas com a felicidade e harmonia das pessoas. A única razão pela qual ele cria leis e faz decretos é pelo bem estar dos seus súditos, e não para o seu próprio benefício. Por isso Rosh Hashaná é o dia de coroarmos D'us como o nosso Rei, dirigente e diretor das nossas vidas. Não fazemos isto por Ele, e sim por nós mesmos, para que Ele possa nos mandar todas as bondades e a Criação possa atingir seu propósito.
Rosh Hashaná é, portanto, o dia em que D'us quer praticar sua característica de fazer bondades. É o dia em que Ele nos implora para que possamos nos transformar, através do mérito de fazermos as escolhas corretas, em utensílios para receber todas as Brachót abundantes que Ele quer nos enviar.
Pelo fato de sermos recriados em Rosh Hashaná, temos a oportunidade de atingir níveis espirituais muito elevados, que não conseguiríamos atingir durante o resto do ano. Podemos nos recriar em um nível muito mais alto, que não éramos capazes nem de sonhar. Por isso, o nível que atingirmos em Rosh Hashaná será o nível que levaremos para todo nosso ano.
Na noite da próxima 4ª feira (28/09) começa Rosh Hashaná, o dia de escolher grandeza para nossas vidas. O dia de acordar para a realidade, de alcançar níveis ilimitados de espiritualidade. Nosso ano e nossa vida dependem disso. Que possamos aproveitar bem este dia tão especial.
Shaná Tová Umetuká – Um ano muito doce para todos.
"Sheticatev Vetechatem Bessefer Chaim Tovim" (Que sejamos inscritos e selados no Livro da Vida).
SHABAT SHALOM
R' Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com/
Gn. 21:1-34 (Maftír Nm. 29:1-6), 1 Sm. 1:1-2:10, 1 Ts. 4:13-18
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