"O Rav Mendel foi enviado para a Sibéria, onde permaneceu um longo tempo preso. Foram anos muito difíceis, mas lá ele aprendeu uma importante lição, que levou para toda a vida.
Seu companheiro de cela era um senhor cuja profissão era caminhar na corda bamba. Sua especialidade era esticar uma corda entre dois edifícios altos e atravessá-la, diante do olhar maravilhado e ansioso dos espectadores. Quando conseguia chegar ao outro lado, era ovacionado pelo público. O Rav Mendel quis entender como ele conseguia realizar tal proeza e perguntou:
- Eu sempre tive uma grande curiosidade. Quando você está lá no alto, suspenso no ar, sem nenhum lugar para se apoiar, como você faz para manter o equilíbrio?
O equilibrista abriu um sorriso, como uma criança que revela seu segredo, e disse:
- É muito simples. Antes de começar a travessia, procuro do outro lado algum objeto e me concentro nele. Não ouso tirar meus olhos daquele objeto enquanto estou caminhando. Não olho nem para a direita e nem para a esquerda. Somente assim, concentrado no meu objetivo e sem tirar os olhos do objeto, é possível atravessar utilizando uma corda bamba"
Este é um grande ensinamento para nosso cotidiano. Nossa vida é como uma corda bamba, pois se não tomamos cuidado, podemos cair a qualquer momento. O segredo é focar em D'us, colocando toda nossa confiança Nele, para conseguirmos assim vencer os desafios e dificuldades da vida.
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Nesta semana lemos duas Parashiót juntas, Behar e Bechukotai, que ensinam Mitzvót muito importantes. Por exemplo, a Parashá Behar começa com a Mitzvá de Shmitá, o Ano Sabático. Após seis anos de trabalho, os donos de terras em Israel não podem trabalhar em seus campos durante todo o sétimo ano, e devem deixá-los abertos a qualquer um que queira usufruir de seus frutos. Por um lado é uma Mitzvá muito difícil de ser cumprida, mas por outro lado é uma grande oportunidade espiritual, pois todos os que a cumprem da maneira correta conseguem enraizar no coração um dos fundamentos mais importantes do judaísmo: a Bitachon (confiança em D'us), a certeza de que D'us tem controle sobre tudo e cuida, de cada um de nós, com Hashgachá Pratid (Supervisão particular).
Quando um engenheiro constrói um prédio, precisa construir um sistema de distribuição de água, para que todos os moradores recebam, em seus apartamentos, água corrente para os mais diversos usos. As instalações de água são compostas por uma enorme caixa d'água localizada na cobertura, uma extensa rede de tubulações descendo pelo edifício e torneiras localizadas dentro dos apartamentos. Este sistema, se não for bem projetado e executado, pode trazer enormes dores de cabeça para os moradores. Por exemplo, o que aconteceria se o engenheiro, por desleixo, deixasse de fazer as tubulações? Mesmo se a caixa d'água estivesse cheia, os moradores não conseguiriam utilizar a água, mesmo abrindo as torneiras.
A Bitachón tem alguns pontos em comum com a tubulação de água de um edifício. Por exemplo, da mesma forma que a tubulação é o que faz a ligação entre a caixa d'água e as torneiras, assim também a Bitachón é a força que traz para o nosso mundo as Brachót criadas por D'us nos Mundos espirituais. Da mesma forma que não adianta abrir a torneira se não houver uma tubulação ligada até a caixa d'água, também não é possível receber Brachót sem que a pessoa desenvolva sua Bitachón.
Mas não é suficiente apenas fazer uma tubulação de qualquer jeito, sem o dimensionamento correto. Ela precisa ser larga, pois quanto mais largo for o tubo, maior a vazão de água que pode passar nele. Assim também é a Bitachón, a cada nível maior que chegamos, mais Brachót conseguimos trazer para este mundo.
E mais um ponto em comum interessante é que a tubulação de água precisa ser íntegra, isto é, sem furos ou rachaduras, pois nestes furos e rachaduras a água vaza e não chega às torneiras. Assim também a nossa Bitachón deve ser completa, devemos tirar do nosso coração qualquer dúvida ou insegurança, pois as dúvidas e inseguranças são sinais de que a nossa Bitachón ainda não é tão completa quanto deveria ser.
Mas como saber se estamos crescendo em Bitachón? Como saber, na prática, se a nossa Bitachón é completa ou se ainda temos "furos na nossa tubulação"? O livro "Chovot Halevavot" (Deveres do coração) ensina que há um indicador do nível de Bitachón: a tranquilidade da pessoa, mesmo diante dos testes e das dificuldades. A pessoa com elevado nível de Bitachón não se desespera diante de uma dificuldade ou sofrimento, ao contrário, fica tranquila e em silêncio, sem reclamações ou cobranças, pois sabe que tem em quem se apoiar, sabe que pode contar com o Criador, que controla todo o universo e nos criou apenas por bondade.
Porém, será que podemos aplicar este conceito à Mitzvá de Shmitá? Pois assim está escrito: "E se vocês disserem: O que vamos comer no sétimo ano, já que não vamos semear nem recolher nossas colheitas? Eu ordenarei Minha benção no sexto ano e farei com que tenham uma colheita para os três anos" (Vayikra 25:20,21). O que aprendemos destes versículos? Que as pessoas que questionarem D'us no ano de Shmitá, dizendo "O que comerei", receberão no sexto ano uma produção tripla, suficiente para os três próximos anos, até que a pessoa possa voltar a produzir e a colher suas frutas. Já as pessoas que não questionarem D'us, de acordo com os versículos, não receberão nada a mais de produção no sexto ano.
Estes versículos, portanto, despertam grandes questionamentos. Como se sustentam as pessoas que não questionam D'us, no ano de Shmitá e no ano seguinte? E como entender os ensinamentos sobre Bitachón se o que os versículos sugerem é justamente o oposto do foi ensinado, pois o correto seria a pessoa ficar tranqüila e quieta, com a certeza de que D'us cuidaria de suas necessidades, e qualquer questionamento seria um sinal de falta de Bitachón. Então por que a Torá diz que justamente uma produção tripla viria para aqueles que questionassem D'us, enquanto aqueles que não questionassem receberiam a mesma quantidade de produção? Isto não é completamente contraditório?
Explica o Sforno, comentarista da Torá, que havia duas maneiras da pessoa ter seu sustento garantido durante o ano de Shmitá e o ano seguinte. Uma maneira era a Brachá de D'us que fazia com que a produção no sexto ano fosse tripla. Mas esta Brachá vinha junto com grande dificuldade e esforço, pois no sexto ano a pessoa precisava trabalhar de maneira exaustiva, três vezes mais do que nos outros anos. Porém, havia outra maneira da pessoa ter seu sustento. Para as pessoas que não questionavam, D'us mandava Suas Brachót de maneira oculta, isto é, a pessoa trabalhava e colhia no sexto ano exatamente a mesma quantidade de comida, mas as coisas milagrosamente duravam 3 anos, pois a pessoa se saciava com muito menos.
Portanto, há uma grande diferença entre aquele que se cala e confia em D'us e aquele que reclama. Aquele que tem Bitachón recebe a verdadeira Brachá, de se saciar com o que já tem, sem nenhum esforço extra. Já aquele que reclama recebe, junto com o sustento, o triplo de trabalho e esforço. A reclamação demonstra falta de Bitachón e, por isso, mesmo que a pessoa receba seu sustento, recebe com um nível de Brachá muito menor.
Explica o livro "Lekach Tov" algo ainda mais profundo. Na realidade, a pessoa que reclama com D'us destrói sua tubulação espiritual, não merecendo mais receber, por seus méritos, as Brachót que estavam guardadas para ela no Céu. Então por que acontecia o milagre da produção tripla? Por causa de uma regra espiritual que "quando uma pessoa se ocupa de uma Mitzvá, nenhum mal pode atingi-la". Isto é, como a pessoa está cumprindo a Mitzvá de Shmitá, a Mitzvá a protege de passar fome e por isso a comida vêm, mas junto com um enorme esforço. A verdadeira Brachá, que traria toda a comida necessária sem nenhum esforço a mais, ela não merece, por ter destruído sua Bitachón.
E assim disse o profeta Irmiahu: "Bendito é o homem que confia em D'us" (Irmiahu 17:7). Quando a pessoa confia em D'us, ela torna-se uma pessoa bendita, isto é, merita todas as Brachót do Céu. E como ela demonstra que confia em D'us? Mantendo-se tranquilo e confiante mesmo diante das dificuldades, sabendo que não há nenhuma necessidade de se preocupar.
Este é um grande ensinamento para nossas vidas. Nossa falta de Bitachón nos faz sofrer por antecipação. Imaginamos que coisas terríveis vão acontecer e, na maioria das vezes, nossas previsões negativas não se cumprem. Perdemos a esperança, desistimos fácil demais. Portanto, aquele que tem Bitachón vive mais tranquilo, mais feliz, e garante que todas as Brachót guardadas para ele no Céu chegarão, mais cedo ou mais tarde, para beneficiá-lo.
"Obstáculos são aquelas coisas assustadoras que você vê quando tira os olhos da sua meta"
SHABAT SHALOM
R' Efraim Birbojm
http://ravefraim.blogspot.com.br/
Behár Lv 25:1-26:2, Lc. 4:16-21
Bechukotai Lv 26:3-27:34, Jr 16:19-17:14, Mt.22: 1-14
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